Estamos em pleno processo eleitoral, em que alguns participam ativamente, outros negam a sua importância e a grande maioria apenas vota porque é obrigado. Além disso, convivemos com a CPI do Cachoeira, o julgamento do mensalão e, do ponto de vista da sociedade civil, dois processos amplos: Grito dos Excluídos e Semana Social Brasileira, que terá como tema “O Estado que temos e o Estado que queremos”. Há também a plataforma dos movimentos sociais coletando assinaturas para a Iniciativa Popular da Reforma do Sistema Político. O que estes processos todos têm em comum? Onde eles se cruzam e onde eles se afastam?
Primeiramente, tanto a CPI como o julgamento mostram que a nossa política está nua! Os processos eleitorais estão contaminados pela corrupção, pela apropriação do público por interesses privados (sejam pessoais ou de grupos) e, principalmente, pelo poder econômico. Ambos refletem o sistema perverso de financiamento da política que temos no Brasil (sistema híbrido, com financiamento privado e público). Este sistema permite que o poder econômico seja o determinante nos resultados das eleições, deixando cada vez mais de lado a vontade do povo.
Este sistema é operado por pessoas ou grupos que não têm compromisso nenhum com o bem público e que buscam na política formas de manter seus privilégios. Neste sentido, a política passa a ser não a busca do bem comum, mas sim a busca, num vale tudo permanente, por se manter no poder, seja econômico, político, cultural ou simbólico.
Esta é uma das razões principais pela maioria votar apenas por obrigação e muitos/as negarem a importância das eleições. Não à toa, é nos processos eleitorais onde menos se discute política e projetos de cidade e sociedade. A eleição hoje é um grande mercado conduzido pelos que mais têm e mais acumulam, não só riquezas, mas principalmente poder.
É neste contexto que organizações autônomas e independentes do Estado e dos partidos estão envolvidas em dois processos amplos que têm como objetivo dialogar com a sociedade em busca de novas formas de se pensar e fazer política. O Grito dos Excluídos e a Semana Social Brasileira retomam a discussão sobre o papel do Estado na construção de uma sociedade mais justa, igualitária e democrática. Ao mesmo tempo, resgatam a importância e o protagonismo das organizações e movimentos sociais na definição deste novo Estado.
Já a plataforma dos movimentos sociais pela Reforma do Sistema Político, com a proposta da Iniciativa Popular nos moldes do Ficha Limpa, discute e propõe uma nova forma de se pensar e exercer o poder. Hoje o nosso poder é todo centrado na representação, cabendo à população “apenas votar porque é obrigada”. Esta forma de exercício do poder precisa mudar radicalmente. Na leitura da plataforma, é necessário criar instrumentos de participação direta da população nas decisões, sem intermediações ou intermediários, fortalecendo a soberania popular.
Para isso, propõe delimitar o poder da representação, retirando de nossos representantes o poder de decidir tudo e sobre tudo. Nesta proposta, determinados temas só podem ser decididos pelo povo de forma direta. Propõe também mudanças nas regras eleitorais que possibilitam o acesso aos espaços de poder por segmentos sub-representados. Enfim, propõe outra forma de construção do poder, em que o povo não apenas chegue ao poder, mas que o próprio povo seja o poder.
José Moroni, membro do Colegiado de Gestão do INESC e da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político