Marcha das Margaridas: Educação não sexista!

 

A relação entre a educação e as mulheres sempre foi marcada por muitas dificuldades, empecilhos, e, sobretudo, por práticas discriminatórias e excludentes. Observam-se as marcas dessa exclusão nos vários períodos da nossa história. No período colonial, por exemplo, as mulheres negras eram escravas e as mulheres brancas dificilmente aprendiam a ler e a escrever, pois a elas era atribuída toda a responsabilidade e o papel de cuidarem do lar, dos afazeres domésticos, da família, da casa, da religião, da reprodução, além de se esperar delas completa submissão aos homens.

A educação ocupa lugar estratégico na defesa de uma sociedade com desenvolvimento sustentável com democracia, justiça, autonomia, igualdade e liberdade, uma vez que ela tem cumprido o papel de reproduzir, de geração em geração, os valores, crenças e conceitos que regem a nossa sociedade. No entanto, também pode ser ela a responsável por construir e produzir uma nova cultura.

A educação deve ser compreendida como um amplo processo de convívio que se dá em vários âmbitos da sociedade, como a família, escola, igreja, trabalho, sindicato, associação, e tantos outros. Assim temos a educação formal, que é aquela que acontece na escola, e a informal, onde aprendemos todo dia, nos nossos trabalhos, nos espaços de participação política, nos diversos espaços de troca e relação social. No campo, o processo educativo deve ser construído tendo agricultoras e agricultores como protagonistas. A construção do conhecimento começa com as crianças que são criadoras e não simples reprodutoras da cultura.

Nesse processo, que chamamos de socialização, se desenvolve o aprendizado sobre o que é ser mulher e o que é ser homem na sociedade. Padrões de comportamento são difundidos como se fossem baseados na natureza de cada sexo. Assim, os padrões definidos pela sociedade do que é ser mulher e do que é ser homem vão sendo naturalizados, reforçados, reproduzidos As mulheres são consideradas “naturalmente” responsáveis pelo trabalho doméstico e de cuidados, atitudes reforçadas por meio de brinquedos dados às meninas, como: bonecas, fogõezinhos, panelinhas.

A educação formal que se realiza nas escolas ainda hoje tem forte caráter sexista, pois reproduz as desigualdades e preconceitos de gênero, nas práticas com alunos e alunas, nos currículos escolares, nos livros didáticos e nas políticas educacionais. Isso pode ser visto na separação entre meninos e meninas nas filas, onde são definidas atividades diferenciadas pelo sexo; quando são dados pratos e talheres róseos para as meninas e azuis para os meninos; quando vemos nos livros as mulheres apenas como mães ou realizando trabalhos domésticos e os homens como heróis e cientistas. Tais diferenciações tendem a reproduzir a ideia de que há lugares, cores, trabalhos próprios para mulheres e para os homens.

Acreditamos que a mudança começa na educação e na formação política das mulheres rurais, com o diálogo entre o feminismo e a agroecologia, nos espaços de formação já existentes em nossas organizações, como as escolas de formação política, nas creches, nas escolas e na formação das/os futuras/os técnicas/os e profissionais nas escolas técnicas e universidades. Mas não apenas nesses locais formais: também consideramos que diferentes espaços de socialização são importantes para nossa formação, como o trabalho, sindicatos, movimentos sociais. É preciso que em todas as atividades de formação sejam garantidas não apenas a presença das mulheres, mas que as demandas trazidas por elas sejam ouvidas e consideradas.

Temos que quebrar as barreiras do preconceito e trazer a voz das mulheres e de sua luta feminista também para a academia e para as organizações mistas, e com isso uma maior visibilidade e reconhecimento da sua importância histórica. É preciso romper com o atual modelo de educação e construir uma educação voltada para a construção da igualdade entre mulheres e homens, e, ao mesmo tempo, reconhecer as diferenças e respeitá-las, para construirmos uma sociedade mais justa e igualitária.

A educação sexista reforça a visão tradicional de homem e mulher, fortalece a submissão das mulheres, reproduz o machismo, o racismo e contribui para a manutenção da violência contra as mulheres, da homofobia (desprezo e/ou ódio a mulheres e homens que assumem orientação sexual diferente da heterossexual) e lesbofobia. A Marcha das Margaridas defende uma educação que rompa com essa ideia patriarcal e machista, por isso defendemos uma educação não sexista.

A situação de invisibilidade e discriminação das mulheres também está expressa no uso da língua portuguesa e da gramática oficiais, ao adotarem o masculino para se referir a grupos mistos. Por exemplo, em uma reunião mencionar companheiros quando há homens e mulheres, falar em os estudantes quando há alunos e alunas. Não, isso não é besteira, nem o correto! As mulheres não se sentem representadas quando não são citadas: a linguagem foi construída tendo os homens como referência, assim como toda a nossa cultura. Nós queremosser vistas e citadas. Dá-se a essa linguagem, que se refere a homens e mulheres, o nome de inclusiva, pois ela cita as mulheres, quem estavam escondidas. Por força da participação política e dos movimentos de mulheres, há mudanças realizadas nessas referências e nomeações no movimento sindical. A adoção de mais um T, de trabalhadora, em MSTTR e na sigla dos sindicatos STTR- Sindicato de Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais é um exemplo disso. No entanto, sabemos que isso tem sido resultado de uma luta histórica das mulheres que enfrentaram não só uma questão gramatical, mas a luta pela visibilidade e reconhecimento do papel e participação das mulheres em nossas organizações.

Um agravante no contexto escolar é o racismo, que reforça as desigualdades sociais, ao difundir a ideia de inferioridade da raça negra, sobretudo, das mulheres negras. Quando as piadas preconceituosas com as crianças negras são consideradas normais, e achamos graça delas, ou quando são contadas histórias onde as/os negras/os sempre estão em papéis inferiores ou em trabalhos socialmente desvalorizados, reproduzimos a ideia de que a cor é importante e que essa realidade de desigualdade não vai mudar. Portanto, a escola tem desempenhado, também, o papel de perpetuar a ideologia e os valores da classe dominante, o preconceito e a discriminação, além de mostrar-se omissa e despreparada para debater temas do cotidiano como afetividade, sexualidade, saúde reprodutiva, violência sexual e violência social.

Se os processos educativos e de socialização, que transmitem e reproduzem a ideologia patriarcal e machista, são construídos nas relações sociais, por meio deles também é possível recriar e transformar valores e hierarquias. A educação, se por um lado, dissemina e reproduz a ideologia patriarcal, por outro, possui grande potencial de transformação e pode se realizar de forma não sexista e não racista.

As Margaridas e a demanda por Educação do Campo

Hoje as mulheres são mais escolarizadas que os homens, mas, ainda persiste uma série de preconceitos e discriminações. Diversos estereótipos são reproduzidos pela sociedade, como é possível observar nas frases: “Homem é cérebro, razão; a mulher é coração, emoção”; “Homem é gênio, mulher é anjo”; “Homem é força, mulher é lágrima; “Homem pensa, mulher sonha”; “Menino pega peso, menina lava prato”; “Menino tem carrinho, menina ganha boneca”. Tudo isso, está fortemente presente no senso comum, e romper com esse tipo de rotulação é um enorme desafio a ser enfrentado pelas mulheres, na luta contra o machismo, o preconceito e todo tipo de violência.

Se por um lado defendemos uma educação do campo, enraizada na realidade rural e orientada por um currículo, calendário, vivências e conteúdos que valorizem as diferentes formas de viver e ser do povo do campo, por outro lado ela só se concretizará na medida em que for capaz de questionar as práticas machistas estabelecidas na sociedade, reconhecendo e valorizando o papel das mulheres do campo, das florestas e das águas.

Sendo assim, a educação, como processo de socialização ou como política social, está em disputa. O projeto de sociedade que a Marcha das Margaridas defende rompe profundamente com os valores sexistas que submetem as mulheres e com as noções preconceituosas que inferiorizam os sujeitos do campo.

A defesa da educação do campo é um elemento central para assegurar melhores oportunidades de vida para a juventude rural. A luta segue não só em favor da ampliação de oferta de ensino, em todos os níveis escolares (em contraponto à significativa onda de fechamento das escolas no meio rural), ela também caminha rumo à valorização das identidades e saberes construídos no campo. Para isso é fundamental a elaboração, avaliação e distribuição de materiais didáticos específicos e não-sexistas para a educação do campo.

É preciso também denunciar e romper com práticas que pensávamos que já haviam sido abolidas, a exemplo do tratamento que ainda hoje é dado às mulheres jovens em algumas escolas agrotécnicas federais, que só disponibilizam os espaços internos de alojamento aos jovens homens. Nestas escolas, as meninas não estão sendo recebidas, sendo necessário que suas famílias paguem alojamentos em repúblicas, que aluguem casas, etc., o que muitas vezes inviabiliza a inclusão das meninas por falta de condições econômicas. A situação gera ainda maior preocupação por parte das famílias, por estas não estarem sob responsabilidade da escola, o que é oferecido apenas aos meninos. Em outros casos de escolas que acolhem as meninas, denunciamos aquelas que não garantem condições para que aquelas que venham a engravidar e ter filhas/os possam continuar seus estudos. Uma verdadeira educação do campo deve proporcionar reais condições de estudo para todas e todos, para que as e os jovens não precisem sair do campo,

Os dados nos mostram que a nova geração de mulheres jovens, tem tido maior acesso à escolaridade quando comparado com suas mães e pais, bem como em relação aos jovens homens. Entretanto, este cenário não foi capaz de produzir efetiva igualdade, sobretudo, quando pensamos nas condições de trabalho e renda. A superação das desigualdades que afetam as mulheres, não se limita à questão da educação, mas a um conjunto de aspectos. A educação que afirmamos deve promover maior emancipação das mulheres do campo, das florestas e das águas. Nesse sentido uma medida importante é garantir permanência das jovens grávidas na escola.

O desafio é grande e isso ficou explícito durante o processo de aprovação do novo Plano Nacional de Educação, que mesmo passando a considerar algumas demandas da educação do campo, excluiu toda referência à discussão das relações de gênero, desconsiderando completamente o debate sobre uma educação não sexista.

As mulheres demandam a criação, manutenção e reabertura de escolas de educação infantil (creches) e ensino fundamental no meio rural, tendo como princípio a educação do campo, com oferta de período integral; e ações de educação infantil nas Escolas Família Agrícola e Casa Familiar Rural, com políticas educacionais que visem combater o caráter sexista da educação, com vigorosa atuação na formação de professoras e professores, na revisão dos currículos escolares e dos livros didáticos. Para isso, é fundamental a elaboração, avaliação e distribuição de materiais didáticos específicos e não-sexistas para a educação do campo.

Junto com a necessidade de ampliar o acesso, debatemos a qualidade do ensino no meio rural com: a melhoria da infraestrutura (com bibliotecas, espaços adequados), a inclusão da abordagem pelas escolas da realidade do campo, da floresta e das águas e de questões da vida cotidiana como a afetividade, a sexualidade, a violência sexual, o racismo, a homofobia, de modo qualificado para possibilitar a superação dos preconceitos e discriminações e a valorização do rural e sua cultura como um espaço de bem viver. O feminismo aporta tanto no conteúdo com o enfrentamento do machismo e da violência quanto na metodologia, rompendo as separações entre razão e emoção e as hierarquias entre professor/a e aluna/o.

É urgente a implementação das Diretrizes Operacionais para Educação Básica nas escolas do campo, fazendo com que estados e municípios pactuem e garantam efetivamente o papel da educação do campo para o desenvolvimento rural sustentável e solidário que defendemos.

Quanto à escolarização de adultas/os, sabemos que o número de analfabetas/os no campo ainda é elevado, sobretudo entre a população idosa. A maioria das/os analfabetas/os brasileiras/os vive na área rural. A taxa de analfabetismo nesses locais chega a 19%. Os homens têm situação educacional ainda pior: 21% de analfabetos. Entre as mulheres, o índice é de 16,9%. (IBGE, 2012)

O acesso à escolarização no campo ainda é precário. É preciso garantir políticas de elevação de escolaridade em todos os níveis de ensino, no meio rural.

Outro fator a ser considerado é a dependência mútua entre as condições precárias de trabalho e a existência de uma mão de obra com baixa escolaridade. É o que ocorre com o assalariamento rural no Brasil. Cerca de 65,3% das assalariadas rurais tem apenas o ensino fundamental incompleto, sendo que destas 13,6% não possuem qualquer grau de instrução, além de um grande percentual das consideradas analfabetas funcionais. Como construir alternativas para as mulheres, como a capacitação e qualificação profissional, sem resolver o problema do analfabetismo e da baixa escolaridade? Como elevar o número de assalariadas rurais nas frentes de trabalho, com boas condições de vida e de trabalho, sem elevar o nível de instrução?

Sexualidade

Muita gente confunde sexualidade com sexo. Quando falamos em fazer sexo estamos falando de uma relação sexual entre duas pessoas. Pode ser homem e mulher, mulher com mulher, homem com homem. Enfim pode se praticar sexo com parceiros ou parceiras de diferentes orientações sexuais.

A sexualidade inclui sexo, mas ela não se limita a ele: a vivência da sexualidade é um aspecto fundamental nas nossas vidas. É a busca do prazer humano em suas diversas formas. O que é prazer é diferente para cada pessoa. Depende muito situação de cada uma, da relação que estabelece com o seu corpo e a sua realidade. Há diferentes maneiras, diversas formas de buscar o prazer, de vivenciar sua sexualidade.

As vivências da sexualidade são influenciadas não somente por aspectos sexuais, biológicos e genitais, mas também pelas relações socioculturais, que determinam os papéis socialmente definidos para homens e mulheres e a reprodução de valores afetivos e morais, difundidos por grupos e instituições sociais como a família, a escola, a igreja e a comunidade.

Vamos dar dois exemplos que podem ajudar a pensar em como o ambiente e os valores influenciam na sexualidade. Primeiro, vamos pensar numa família que mora em dois cômodos ou está num acampamento, um local em que as pessoas não podem explorar livremente sua intimidade e desejos com receio que as/os filhas/os vejam ou escutem.

Uma segunda situação é aquela que nos foi ensinada quando crianças: que o sexo é para reprodução e não para o prazer. Todas nós sentimos vontades, desejo de explorar nosso corpo e o corpo de nosso parceiro ou parceira e também de que façam o mesmo conosco, mas muitas vezes os ensinamentos que tivemos durante anos nos reprime, nos impede de seremos livres para fazer isso.

Há outros exemplos, mas esses dois nos ajudam a pensar como as condições materiais e a cultura patriarcal contribuem para impor limites à nossa sexualidade: nos dois casos, as pessoas não devem estar felizes, porque estão sem liberdade para sentir prazer, sem local apropriado para terem respeitada sua intimidade, tendo que reprimir desejos.

Por isso, apesar de ser um lado importante de nossas vidas, para muitas mulheres esse tema ainda é um tabu. Há muito silêncio sobre o que se passa na intimidade e, em muitos relatos, as mulheres consideram sexo como tarefa, como uma obrigação de se submeter ao desejo do outro, do marido.

A lógica dominante é de que a sexualidade deve obedecer à natureza determinada pelas diferenças biológicas entre os sexos, e que homens e mulheres trazem consigo, uma natureza que define o modo de sentir, manifestar e realizar a sua sexualidade.

Essa ideia obedece aos padrões atribuídos como femininos: o caráter amoroso e passivo da sexualidade feminina, em contraposição, ao caráter ativo, viril e insaciável do homem. Tal concepção de sexualidade resulta em um padrão de comportamento sexual, considerado normal, que se realiza entre um homem e uma mulher, denominado heterossexual. A heterossexualidade é considerada o normal, o padrão de sexualidade, com base na função reprodutora. Porém, a realidade é complexa, demonstrando que há uma diversidade de expressões da sexualidade nas relações interpessoais.

A imposição de um padrão de comportamento sexual é legitimada com o argumento da natureza distinta e complementar de homens e mulheres e pelo destino biológico, que associa sexualidade à reprodução e não ao prazer. Esse padrão esconde a discriminação, as relações de poder, de dominação e opressão que as mulheres sofrem.

Outro aspecto importante a destacar diz respeito à discriminação sexual contra a mulher idosa. A sociedade considera a sexualidade da mulher idosa como inexistente ou desnecessária, mas acha normal que os homens idosos usem Viagra e estejam sempre em busca de uma mulher mais jovem. Para as mulheres idosas continua reservado o lugar de cuidadora da família, das/os filhas/os e netas/os. Muitas mulheres idosas são vítimas de violência sexual, mas não denunciam por temerem serem ridicularizadas ou por acharem que não irão acreditar. Outro aspecto muito citado são os casos de HIV em homens e mulheres, em função do não uso de preventivos nas relações sexuais na terceira idade. Geralmente, as mulheres denunciam que com o uso do Viagra os maridos passaram a ter relações sexuais fora do casamento, mas que não se previnem e acabam as contaminando.

Tradicionalmente, espera-se que as chamadas “mulheres de família” devem ter uma sexualidade disciplinada e conduzida pelo homem. Este, por sua vez, é livre para realizar a sexualidade fora dos limites da reprodução, ou seja, não só com sua esposa, para exercer a sexualidade e ter prazer, pois a ideia dominante é que faz parte da natureza masculina a permanente necessidade de sexo, desejos que devem ser satisfeitos, não importando o que isto possa significar e custar para a parceira.

A sexualidade deve ser vista como parte fundamental da autonomia das mulheres. Esse é um debate que precisa ser retomado, para lembrar que o prazer não está necessariamente ligado à gravidez e questionar a hipocrisia da sociedade, e especialmente dos homens, que enaltece as mulheres nuas em revistas, propagandas e condenam a livre expressão da sexualidade feminina.

O direito à livre orientação afetiva sexual tem sido reivindicado na sociedade brasileira, mas são muitas as denúncias de intolerância. As práticas de homofobia e lesbofobia se manifestam, a partir de atitudes e práticas discriminatórias, de repressão e violência às/aos homoafetivos/as, que fogem ao padrão heterossexual.

As mulheres vêm sofrendo, ao longo da história, violações ao direito sobre o próprio corpo e a modo de viver a sua sexualidade. A defesa da autonomia das mulheres com o slogan “Nosso corpo nos pertence”, significa que o corpo é seu território, o lugar onde habitam e existem, portanto, lugar inviolável, onde a autonomia e a liberdade das mulheres devem se realizar. Esta pressão sobre os territórios se expressa também no corpo das mulheres: na violência e a prostituição de mulheres no entorno das grandes áreas de monocultura e mineração; na medicalização das fases da vida da mulher, e na imposição de um padrão de beleza que considera que as mulheres com as mãos calejadas e a pele queimada não são bonitas.

As discriminações ao corpo e à sexualidade das mulheres, em grande parte resultam de desinformação e expressam tabus ainda vigentes na sociedade. O padrão de beleza e a ideia de saúde da mulher disseminados pela mídia revelam a mercantilização do corpo das mulheres, para o qual há um amplo mercado de produtos, desde a juventude à terceira idade, abrangendo a maternidade e os ciclos da mulher, como a menstruação, o climatério (fase de transição do período reprodutivo fértil para o não fértil, quando a menstruação vai diminuindo, as mulheres sentem, por exemplo, ondas de calor e alteração de humor) e a menopausa (a última menstruação da mulher).

As mulheres do campo, da floresta e das águas estão sujeitas a muitos tabus e discriminações, também estando expostas a essa lógica de mercado que compõe e fortalece a realidade de violência a que estão expostas no seu cotidiano. Um exemplo disso está na visão enraizada na sociedade de que mulher da roça não pode andar de unhas pintadas, nem tampouco estar vestida como “mulher da cidade”. Vemos estes estereótipos reproduzidos no dia a dia das trabalhadoras rurais, chegando inclusive a serem usados como argumento para a negação de direitos, a exemplo de servidores públicos que não reconhecem as trabalhadoras rurais e seus direitos a benefícios específicos por elas terem as unhas pintadas, limpas, pele e cabelos cuidados.

Faltam iniciativas de políticas, por parte do Estado, que possam assegurar as condições para o livre exercício da sexualidade, autonomia e domínio sobre o corpo, bem como as condições necessárias para uma vida saudável.

Educação sexual

Ao falarmos da importância de haver uma educação não sexista e condições para que as pessoas possam viver sua sexualidade livremente é importante que ao longo do processo de educação haja uma preocupação em ensinar as crianças e jovens a entrarem em contato com seu próprio corpo, suas necessidades e desejos e aprenderem a respeitar as demais pessoas em suas escolhas.

A educação sexual, com o nome de Orientação Sexual entrou nos currículos escolares por meio dos PCN’s (Parâmetros Curriculares Nacionais), por considerar que existia necessidade de maior orientação aos adolescentes dentro das escolas.

Ao contrário do que muita gente pensa a educação sexual não é o mesmo que incentivar a iniciação da vida sexual. Ela tem o objetivo estimular as crianças a desenvolverem uma relação saudável e amorosa com seus corpos, de orientar as/os adolescentes a respeito de prevenções de doenças sexualmente transmissíveis, uma possível gravidez indesejável, mostrando como é importante respeitar e conhecer seu próprio corpo, sua sexualidade.

A proposta sugere que o tema seja tratado por um conjunto de matérias, cabendo à/ao professor/a ter orientação e avaliação para ministrá-lo de forma coerente, mostrando às/aos jovens a importância de se conhecer, saber os seus próprios limites e mostrar que essa sexualidade deve ser entendida como parte do bem estar e da saúde.

A escola não deve se colocar como aquela que diz o que é certo e o que é errado, mas sim ouvir essas/es adolescentes, saber o que elas/es pensam. A sexualidade ainda é vista como tabu, porque para muita gente, em especial as/os adolescentes, ela vem acompanhada de dúvidas, repreensões ou traumas, principalmente por ser um tema que as famílias têm dificuldade de discutir em casa. Essa falta de diálogo tem contribuído para perpetuar casos de abusos sexuais sofridos pelas crianças, silenciados tanto em casa quanto na escola. O papel da escola, como o primeiro espaço de relação das crianças e adolescentes fora da família, é também o de contribuir para desvelar e denunciar situações de maus tratos e exploração sexual, levando informações sobre direitos sexuais. O trabalho da orientação sexual é, então, proporcionar às/aos jovens a possibilidade do exercício de sua sexualidade de forma responsável e prazerosa.

O Estado deve promover um amplo processo de formação das/os profissionais da educação, acompanhada pela reformulação curricular e dos livros didáticos, na perspectiva de romper com os métodos e técnicas ainda utilizadas pela educação tradicional. É preciso que estas/es profissionais sejam qualificadas/os para a construção de um novo sistema de ensino capaz de contribuir com a igualdade entre homens e mulheres, rompendo assim, com os padrões de gênero imposto pela cultura patriarcal e machista.

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