De fato, o patrocínio aos eventos oficiais, bem como a participação de magistrados atrelada a cortesias materiais, como transporte, hospedagem ou qualquer outro tipo, deve ser vedada, uma vez que reflete uma dimensão não declarada da estratégia judicial de empresas, bancos e confederações classificadas, segundo o Conselho Nacional de Justiça – CNJ, como os “maiores litigantes”.
Desse modo, o patrocínio aos eventos de formação técnica, cultural e de confraternização de magistrados traduz uma estratégia econômica voltada não para o poder de consumo da magistratura, mas para o êxito dos negócios e contratos questionados nas ações judiciais, com valores que superam a casa dos bilhões de reais.
Por essa via indireta, porém não menos potente, o poder econômico se aproxima do Poder Judiciário com vistas a construir a sua legitimidade, em detrimento dos milhões de trabalhadores e trabalhadoras, comunidades, militantes, consumidores e consumidoras, correntistas, cidadãs e cidadãos que lutam por seus direitos nas ações judiciais, mas não possuem as mesmas condições econômicas de se posicionar, dialogar e discutir seus direitos com uma magistratura ainda avessa, com valorosas exceções, aos problemas sociais de nosso país.
O ordenamento jurídico brasileiro já dispõe de dispositivo que busca preservar o Poder Público, Judiciário incluído, da influência do poder econômico sobre políticas públicas, mecanismo normativo que deve inspirar e dar subsídio à resolução do CNJ.
É o caso do artigo 5.3 da Convenção Quadro para o Controle do Tabaco (Decreto 5.658/2008) que prevê que os governos devem agir para proteger as políticas de saúde pública dos interesses comerciais da indústria do tabaco.
É pela via indireta, portanto, que a presença institucional de grandes empresas, bancos e confederações patronais, dente outros atores do poder econômico, acaba por interferir na autonomia e independência da magistratura.
Por esses motivos, as entidades solicitam ao CNJ que seja aberta uma consulta pública para a efetiva participação e contribuição da sociedade na elaboração da resolução que irá regulamentar a proibição dos patrocínios e cortesias em eventos para juízes e servidores do judiciário.
A participação social é corolário da democracia brasileira e deve ser exercida também junto à política pública de justiça, inclusive a que emana do próprio Poder Judiciário. Ressalte-se, que quando discutida no plenário do CNJ, todos os votos contrários à realização da consulta pública sobre o tema vieram de magistrados, conforme ementa da votação (Ato Normativo 0006235-27.2011.2.00.0000). O Min. Cezar Peluso, por seu turno, pretendia que a consulta fosse realizada apenas junto à magistratura.
A realização da consulta pública vem fortalecer uma cultura democrática para a administração da justiça, idéia ainda distante das cúpulas dos tribunais brasileiros. Nesse sentido, chamamos a atenção de todas e todos para a importância da participação deste importante momento da democracia brasileira, com vistas à construção de uma cultura judicial mais democrática e sensível aos problemas da população brasileira.
Acesse o ofício enviado ao CNJ
As organizações solicitam no ofício:
(i) Disponibilização às signatárias da versão mais atual da proposta de Resolução desse Conselho que será levada à consulta pública, bem como a publicação dessa proposta no site do CNJ; (ii) Abertura do processo de Consulta Pública a todos os setores da sociedade; (iii)Divulgação da data de realização da Consulta Pública com antecedência mínima razoável; (iv)Disponibilização da deliberação da sessão administrativa a respeito do formato da consulta pública – caso essa decisão não tenha sido tomada até o momento, pedimos a publicidade da data da sessão administrativa em que isso ocorrerá.
Assinam esta nota:
Articulação Justiça e Direitos Humanos – JusDh
Aliança de Controle do Tabagismo – ACT