Só com pressão popular aprovaremos uma Reforma Política boa para o povo – Entrevista com Chico Alencar (PSOL)

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Plataforma Reforma Política: A cada início de ano, o tema da Reforma Política é apresentado como uma das prioridades no Congresso Nacional. Se é prioridade, porque a Reforma Política ainda não foi aprovada no Congresso?

Chico Alencar: Durante o período eleitoral, a Reforma Política é sempre apresentada como prioridade para o país. Os mandatos começam e, após muito se discutir, os projetos de Reforma terminam abandonados. E isso vai se repetindo ano após ano, enquanto o sistema político brasileiro, um dos mais atrasados do mundo, fundado no clientelismo para reprodução de mandatos, deixa de avançar.

É preciso entender que as mudanças realmente necessárias ao país interferem, de forma direta, nos interesses de grande parte dos grupos políticos do Brasil. Se fizermos uma Reforma Política que realmente promova mudanças nesse sistema, muitos desses grupos perderão privilégios, e terão dificuldade de produzir e reproduzir mandatos. Esses setores estão diretamente vinculados a grupos econômicos e midiáticos igualmente poderosos, e também não interessa a estes que uma Reforma Política seja aprovada. Eles não aceitam que as maiorias sociais possam se tornar maiorias políticas. Por isso, os modelos de Reforma Política propostos por parlamentares de base popular são, em geral, completamente diferentes daqueles propostos por parlamentares vinculados a grandes corporações. Nunca haverá consenso entre eles: é uma disputa.

A pergunta que se impõe é clara: Se os responsáveis por mudar um sistema nocivo são os próprios beneficiados por ele, como pode haver mudança? Ora, o processo da lei do Ficha Limpa, por emblemático que foi, responde a esse questionamento. No início, quase ninguém apoiava. Com o crescimento massivo da pressão popular, incluindo a criação de movimentos – como o Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) –, a lei terminou aprovada, e valerá para 2012. Ou seja, só com mobilização e pressão popular aprovaremos uma Reforma Política boa para o povo brasileiro. Não há outra receita.

Como o seu partido está atuando para o avanço da pauta?

Chico Alencar: Não há, no Congresso Nacional, um partido que coloque mais a Reforma Política na centralidade da agenda do que o PSOL. Para nós, ela faz parte da espinha dorsal de um corpo de reformas necessárias a esse país. Logo que iniciei esse mandato, em 2011, apresentei ao Parlamento uma longa análise de nossa leitura sobre a melhor Reforma Política.

A bancada do partido tem participado de todos os espaços políticos criados, no Congresso Nacional, para debatê-la. Também atuamos em sintonia com os movimentos que defendem essa bandeira – respeitando, sempre, sua autonomia e centralidade nas decisões. Utilizamos nossos instrumentos de comunicação, e eventuais intervenções na mídia, para propagar a necessidade da Reforma, de modo a alimentar a participação social.

Diversos são os entendimentos e proposições sobre a Reforma Política. Qual o conceito de Reforma Política que o seu partido adota?

Chico Alencar: Em primeiro lugar, é preciso que se diga que nossa proposta de Reforma Política não é definida por caciques. É debatida com toda a militância, nos espaços políticos internos do partido. Temos construído coletivamente, há muito tempo, nosso projeto de Reforma. E é preciso que esse raciocínio seja levado ao Congresso Nacional. Construir a Reforma Política sem a participação da sociedade civil organizada não só é antidemocrático, como pode gerar recuos ainda maiores.

O ponto mais elementar da Reforma que o PSOL propõe é o financiamento público de campanha. As eleições se tornaram, no Brasil, um imenso mercado, com orçamentos milionários, onde candidatos sem apoio dos grandes grupos econômicos não têm condições de fazer campanha. O resultado disso é que são eleitos aqueles que tiveram mais dinheiro para fazer campanha, e não necessariamente os melhores postulantes. Empossados, não raro os eleitos passam a defender os interesses das empresas que financiaram sua campanha. A política torna-se refém da economia. E muita gente boa fica fora da vida pública, porque não teve dinheiro para fazer campanha. Portanto, defendemos o fim do financiamento privado.

Defendemos, ainda, o voto proporcional. A proposta conservadora, do voto distrital, estimula o caciquismo, o localismo da política miúda, exclui a pluralidade e as minorias. Quem defende a democracia participativa, a presença plena da cidadania no processo político, a diversidade da livre manifestação das diferenças, em um país de dimensões continentais e marcado por tantas desigualdades sociais e regionais como é o nosso, deve defender o voto proporcional. É necessário, entretanto, corrigir distorções para garantir a proporcionalidade do voto. Um partido que receba 10% dos votos deverá ocupar 10% das cadeiras, preservando, com a máxima fidelidade, a composição política do eleitorado. O voto distrital, ao contrário, premia o eleito e esteriliza os demais votos.

Também defendemos a lista partidária pré-ordenada e flexível. É o mecanismo mais adequado ao sistema de voto proporcional. É o partido quem escolhe, nesse modelo, a nominata de candidatos. O foco da escolha do eleitor se desloca da pessoa do candidato – o que configura personalismo, culto a figuras carismáticas ou celebridades sem espírito público – para os programas partidários. Exige acompanhamento e participação. Defendemos ainda que a lista seja flexível. A ordem dos candidatos, na relação apresentada pelos partidos, poderia ser alterada de acordo com a vontade do eleitor. Isso permitiria, inclusive, que os brasileiros pudessem continuar votando no candidato ou na legenda, como já fazem, respeitando a cultura política brasileira, e por consequência desconstruindo os argumentos dos críticos ao mecanismo.

Você pode encontrar mais informações do que propomos no nosso site:
http://www.chicoalencar.com.br/_portal/noticias_do.php?codigo=451

Numa reforma do sistema político brasileiro, qual deve ser o espaço da democracia direta?

Chico Alencar: O maior possível. Privilegiei, na minha resposta anterior, nossas propostas – abertas a debate – de “Reforma do Sistema Eleitoral”, que é um dos eixos da Iniciativa Popular para a Reforma do Sistema Política. Entretanto, a “democracia direta”, outro dentre os três eixos, tem igual importância. Principalmente num contexto de avanços tecnológicos que possibilitam pensar em novas formas de participação do cidadão no processo legislativo e executivo. O PSOL tem defendido, sistematicamente, a realização de plebiscitos e referendos para decidir determinados temas. Nós temos, em países vizinhos, experiências muito ricas de aprofundamento da democracia direta, com o uso desses instrumentos. O voto universalizado é uma conquista histórica, mas não pode ser interpretado como um cheque em branco que o eleitor dá ao eleito.

Destaque as principais propostas do seu partido para a Reforma Política.

Chico Alencar: A resposta 3 contempla essa pergunta.

Como o seu partido avalia a proposta de Iniciativa Popular para a Reforma do Sistema Político?

Chico Alencar: Sempre defendi uma Reforma Política com participação popular. Sem um processo de estímulo ao debate com a sociedade civil organizada, qualquer projeto de Reforma se torna antidemocrático e ilegítimo. Por isso, sou um entusiasta da Iniciativa Popular para a Reforma do Sistema Político. Uma proposta muito interessante, com diversos elementos que contam com nossa inteira concordância. As propostas, evidentemente, deveriam ser abertas ao debate. Mas, a princípio, são um excelente esboço das transformações necessárias a esse país.

 

Entrevista realizada por Paulo Victor Melo
Fotos: Arquivo Mandato Chico Alencar e internet

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