. Não conseguiu fazer no primeiro mandato e apenas no dia 29 de setembro de 2009 sancionou com alguns vetos, o Projeto de Lei n. 5498/2009. Foi chamada apropriadamente de mini-reforma eleitoral, porque não alterou substancialmente o sistema eleitoral e partidário.
Em outubro de 2010, logo após a eleição, Lula disse numa entrevista que assim que deixasse a Presidência iria se empenhar na aprovação de uma reforma política. No curso da campanha eleitoral, o tema não foi debatido, no entanto, em seu primeiro discurso como presidente, Dilma Rousseff defendeu mudanças profundas no processo eleitoral, afirmando que “Na política, é tarefa indeclinável e urgente uma reforma com mudanças na legislação para fazer avançar nossa jovem democracia, fortalecer o sentido programático dos partidos e aperfeiçoar as instituições, restaurando valores e dando mais transparência ao conjunto da atividade pública.” Estas declarações poderiam indicar a disposição de, após oito anos de idas e vindas, a reforma política pudesse ser votada no congresso.
No início de março de 2011 foi constituída uma comissão Especial de Reforma Política no Senado, com prazo de 45 dias para apresentar o relatório, o que ocorreu no dia 13 de abril. Foram 16 propostas algumas inclusive que já constavam em relatórios anteriores (tanto do Senado (1995) como da Câmara dos Deputados (2003), mas nunca foram votadas, como, por exemplo, o financiamento público de campanhas e o sistema de listas fechadas.
Como novidades do relatório do Senado a proposta de redução de dois para um os suplentes de senadores (que só assumiria o cargo só em caso de afastamento do titular e, em caso definitivo, haveria uma nova eleição); a candidatura avulsa (apenas para vereadores e prefeitos e nesse caso, o registro das candidaturas devem ter pelo menos 10% de adesão do eleitorado dos respectivos municípios); aumento da quota de mulheres dos atuais 30% para 50%; fim da reeleição para presidente da República, governadores e prefeitos, manutenção do voto obrigatório e à aprovação das propostas à consulta popular, através de um plebiscito.
Dessas propostas, a candidatura avulsa se aparece como novidade (e, a meu ver, sem qualquer possibilidade de ser aprovada) é muito restritiva, afinal, como um candidato, por melhor que seja, mas sem recursos, pode conseguir a adesão de 10% do eleitorado de um município? Na eleição de 2008, por exemplo, o vereador mais votado em Natal foi Paulo Vagner (PV) com 14.444 votos.
Em relação à realização de um plebiscito, além de não ter possibilidade de aprovação, ainda teria de esclarecer como isso se daria, ou seja, como fazer. Votar em bloco as propostas? Mas, se o eleitor concordar com uma proposta e não com a outra? E mesmo que seja por propostas (que são muitas), como estabelecer as que seriam aprovadas, ou seja, qual o percentual necessário para aprovação? Enfim, a exemplo da candidatura avulsa, não tem qualquer chance de ser aprovada.
Quanto a Câmara dos Deputados, foi constituída uma comissão no dia 15 de março de 2011, com 39 integrantes e prazo de 180 dias para apresentar um relatório. O Dep. Henrique Fontana (PT-RS) foi indicado relator e no dia 17/08/2011, apresentou à comissão o relatório (que ainda deverá ser votado na Comissão para depois ir para votação no plenário. A votação da comissão estava prevista para ser votada no dia 9 de setembro e o parecer final do relator seria apresentado no dia 14 de setembro). Para o relator um dos principais objetivos das propostas é o de “alterar a lógica perversa do funcionamento do sistema eleitoral atual”.
Em relação à comissão do Senado, há propostas comuns, como a do financiamento público exclusivo de campanhas eleitorais. Esta proposta, presente em todos os relatórios das comissões do Congresso, parece-me uma das mais relevantes porque, como disse o relator “visa combater a influência do poder econômico nas eleições” e tornar as eleições mais equânimes e no artigo “reforma valoriza o voto do eleitor” (Folha de S.Paulo, 27/08/2011) que “a transformação de campanhas em engrenagens caras e sofisticadas empobrece o verdadeiro debate político e praticamente fecha o caminho da representação para setores sociais com menos acesso a recursos financeiros”.
De fato. A prevalência do financiamento privado, como ocorre nas eleições no Brasil, além da possibilidade de escândalos (recursos ilícitos para campanhas, caixa dois etc.), aliás, muito freqüentes, torna o processo eleitoral muito desigual: uns arrecadam muito e outros, pouco ou nada e acima de tudo, perpetua a hegemonia do poder econômico, ou seja, seu peso decisivo nas eleições. E se é desigual, fere o princípio da democracia, que é o da igualdade. Esta é certamente uma das principais distorções do processo eleitoral brasileiro.
Da forma como está, é o dinheiro investido na campanha que fundamentalmente define o resultado da eleição e isso, parece-me, afeta a essência da democracia e coloca o seguinte problema em relação à representação: Afinal a quem representam os eleitos? O(s) eleitor (es) ou o(s) financiador (es) das campanhas?
Há também algumas diferenças, como a proposta do uso da internet para assinaturas necessárias à apresentação de projetos de iniciativa popular, do fim das coligações em eleições proporcionais e a criação da federação partidária (os partidos devem ficar coligados por pelo menos três anos) e a adoção de um sistema eleitoral misto. Nesse caso, o eleitor vota duas vezes: a primeira numa lista de candidatos do partido e, depois, no candidato de sua preferência. Assim, o candidato que está no topo da lista pode não ser eleito, caso os eleitores mudem a ordem dos candidatos (conhecida como lista flexível, utilizada em alguns países como Holanda, Áustria, Dinamarca, Grécia e Suécia, por exemplo) e me parece ser bem mais democrática, por dar mais liberdade ao eleitor.
A questão é: aprovados os relatórios das comissões, quais as possibilidades das propostas serem votadas e aprovadas no Congresso? A meu ver, para ter validade nas eleições do próximo ano, nenhuma. Teriam de ser votadas até o dia 1 de outubro, portanto, votar em pouco mais de duas semanas (e4 a5 dias de trabalho efetivo dos parlamentares) o que não fez em 16 anos. Talvez uma ou outra proposta e só.
Tem sido sempre assim, pelo menos desde o governo de Fernando Henrique Cardoso: defende-se a necessidade de uma ampla reforma política (“mãe de todas as reformas”), constituem-se comissões, apresentam-se relatórios… que não são votados no Congresso.
Não creio que desta vez seja diferente. A única possibilidade de mudanças é uma participação maior da sociedade, através de distintas organizações. Nesse sentido é importante destacar a iniciativa de cerca de 60 entidades, como a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, OAB, ABI, Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), entre outras, que em agosto de 2011, iniciaram uma campanha de coleta de assinaturas para a apresentação de uma proposta de iniciativa popular para promover a reforma política.
Para que a proposição inicie a tramitação é necessário ao menos um milhão de assinaturas em pelo menos cinco estados, de maneira que 1% do eleitorado nacional (com a exigência de 0,3% dos eleitores de cada estado), no mínimo, dele participe. É um enorme desafio, mas, como exemplificou a Lei da Ficha Limpa, possível e apresenta propostas inovadoras como à criação do “veto popular”, por meio do qual se poderia contestar uma lei aprovada no Congresso (submetido a referendo); fim das votações secretas no Poder Legislativo e a imunidade parlamentar (exceção dos casos de liberdade de manifestação ideológica ou pronunciamento de denúncia), assim como o foro privilegiado (julgamento apenas no Supremo Tribunal Federal) resguardado os casos em que o julgamento se restrinja ao exercício do mandato ou do cargo.
Para a Plataforma dos Movimentos Sociais a questão não se restringe apenas a reforma no sistema eleitoral, mas fundamentalmente o do aperfeiçoamento da democracia representativa. O objetivo é o do fortalecimento da democracia direta, com propostas para que o povo decida através de plebiscito, referendo e iniciativa popular, a democratização da informação e da comunicação e o que chama de “democratização e transparência do Poder Judiciário”.
Embora seja fundamental a participação da sociedade civil, é importante destacar que há no congresso, embora em minoria, parlamentares favoráveis a uma ampla reforma política, como os que integram a Frente Parlamentar Mista para Reforma Política com Participação Popular. Presidida por Luiza Erundina (PSB/SP) foi criada em 2007, e ao longo dos últimos quatro anos, contribuiu para que houvesse debates no parlamento, discussão e apresentação de propostas de entidades da sociedade civil, contribuindo inclusive para a aprovação da Lei da Ficha Limpa. No entanto, não conseguiu ter uma atuação permanente, tanto é assim que no dia 23 de março de2011 aFrente Parlamentar foi reinstaurada com solenidade no Congresso e a partir de então tem procurado, dentro de suas possibilidades, aprovar propostas importantes para uma ampla reforma política, encaminhando propostas às comissões, mas, minoritária, não tem conseguido e nem vai conseguir aprovar uma ampla e necessária reforma política, daí a importância fundamental da participação da sociedade. Sem isso, a depender apenas de uma minoria no Congresso, não haverá reforma política nenhuma.
Fonte: Carta Potiguar
Por Homero de Oliveira Costa, prof. de Ciência Política da UFRN