Nota sobre programa Pátria Voluntária

Nota da Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político sobre programa Pátria Voluntária

O governo federal lançou, nesta terça-feira (9), decreto que cria o programa Pátria Voluntária, “destinado a engajar instituições públicas, sociedade civil e setor privado no fomento ao voluntariado no país”. Segundo fontes oficiais, as ações serão propostas e conduzidas por um conselho constituído por 24 membros – 12 representantes de ministérios e 12 representantes não governamentais.

Para a Plataforma dos Movimentos Sociais pela Reforma do Sistema Político, tal programa inverte completamente o sentido que política e historicamente o Brasil vinha construindo, desde 1988, à participação cidadã e à construção de políticas públicas.

Entendemos que cabe ao Estado incentivar e fomentar práticas voluntárias, mas não como substituição a políticas públicas. O voluntariado como manifestação individual deve ser valorizado, porém jamais como algo que substitua o Estado em suas atribuições.

Há um claro risco de que se consolide, com este programa, a ideia de que o Estado brasileiro pode secundarizar suas responsabilidades em relação à população. Mais uma vez, os defensores do Estado mínimo relegam a questão social ao âmbito das boas ações individuais – ou, quando esta fracassa, à esfera policial. A noção de cidadania calcada na ideia de sujeitos que merecem e demandam direitos é esvaziada e substituída pela de favor aos desprivilegiados.

A adoção do programa “Pátria Voluntária” substitui o programa “Viva Voluntário”, que incentivava o voluntariado no país e ao mesmo tempo incluía nos processos de tomada de decisões voluntários/as, organizações de voluntários e outras que têm o voluntariado como eixo importante para a realização de suas atividades. No novo programa, torna-se evidente a perda de protagonismo da sociedade civil na elaboração das diretrizes que orientarão o voluntariado no país e a centralização da tomada de decisões no Ministério da Cidadania. No programa anterior, havia um chamamento público para a composição dos representantes da sociedade civil. Neste, os membros da sociedade civil são designados pela Ministro de Estado da Cidadania.

Conselhos, historicamente, são frutos de processos de conferências, demandas de segmentos representativos da população – e não parece ser este o caso. A participação institucionalizada, para ser legítima, precisa ser autônoma, inclusive na liberdade que a sociedade tem para escolher a sua representação. Não pode ser uma representação individual; deve ser coletiva e representar segmentos da sociedade.

Além disso, concede-se ao Ministério atribuições que eram do Conselho anterior, diminuindo as possibilidades de participação efetiva da sociedade civil no programa de voluntariado. O fato, ainda, de ser o Ministério da Cidadania que propõe e abriga tal proposta, sendo esta a instância governamental responsável pela gestão e operação de políticas de desenvolvimento social e de combate à fome, acende o alerta para a inevitabilidade de que, contrariando os esforços públicos das últimas décadas, novamente estas políticas sejam conduzidas sob perspectivas conservadoras, assistencialistas, voluntaristas, motivadas pela caridade e boa vontade – em contraposição à perspectiva do direito e da responsabilidade estatal com a proteção social dos cidadãos e cidadãs e pelo combate permanente à pobreza no país.

Cumpre ressaltar também algumas modificações trazidas pelo decreto 9.906 frente ao decreto 9.149 – que foi revogado e instituía o Programa Nacional de Voluntariado. O Governo Bolsonaro aproveita a redação utilizada no decreto anterior para instituição do novo programa, mas retira de seu texto o enfoque dado nos objetivos de desenvolvimento sustentáveis e na Agenda 2030. Novamente, o governo demonstra seu descompromisso com uma agenda mais sustentável e inclusiva que trata de mudanças positivas à sociedade.

Para a Plataforma e as organizações que a compõem, a criação do programa é tão somente mais uma iniciativa do governo federal que vai na direção do desmonte de instituições participativas, criadas por setores progressistas da sociedade que defendiam direitos sociais, para recriá-las com outros sentidos e com composições mais favoráveis ao governo – a exemplo do Decreto 9.759/2019, que extingue e limita órgãos colegiados ligados ao governo federal.

 

 

 

 

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