Para pensar Suzano

Cleo Manhas, assessora política do INESC

O que aconteceu na escola em Suzano não é corriqueiro no Brasil, mas também não é inédito, já que tivemos dois episódios anteriores: em 2011 no Rio de Janeiro e em 2017 em Goiânia. No entanto, ao que parece, estamos herdando um comportamento comum nos Estados Unidos, onde ataques como este ocorrem com maior frequência.

Quando uma tragédia dessas proporções advém, o que mais se vê são analistas de plantão fazendo interpretações e receitando remédios rápidos e aparentemente eficazes. No caso em questão, solução bizarra foi proposta por dois senadores da República: armar os professores. Ideia, aliás, aventada por Donald Trump, na linha de “imitamos os estadunidenses com prazer”.

Imaginemos a cena: uma professora em sala de aula com um coldre na cintura, armada para proteger seus alunos. E como um dos atiradores era um adolescente de 17 anos, obviamente a solução “redução da idade penal” retorna com força e como panaceia para resolver qualquer mazela, mesmo que estejamos falando de um dos países mais violentos do mundo.

De acordo com o noticiado, o atentado guarda semelhanças com o ocorrido em Columbine, Estados Unidos, em 1999, também praticado por dois jovens ex-alunos da escola, que se inspiraram em videogames e provavelmente teriam sido vítimas de bullying. Então, na época houve uma investida em analisar e até criminalizar jogos, além de trazer o bullying para o centro do debate. No entanto, medida alguma de prevenção foi tomada. Não há programas de atenção e acolhimento à jovens com depressão, mesmo que pesquisas demostrem ser cada vez mais comum os episódios da doença entre esse público. No caso do ex-aluno adolescente, consta na secretaria da escola que ele é evadido. Ele morava na vizinhança e não ocorreu a esta direção procurar saber o porquê do abandono escolar, ou avisar ao Conselho Tutelar, o que é sua obrigação.

O retorno da pauta da redução da idade penal é frequente, o que não acontece é uma discussão sobre a etapa peculiar da adolescência, com a qual é preciso um olhar dedicado e atento para dar apoio no momento de tantas alterações físicas e psíquicas. Contudo, soluções fáceis e violentas são sempre apresentadas, refletindo o quanto somos uma sociedade que apela sempre para medidas punitivas, especialmente, se estivermos tratando de pessoas que estão nas margens, que são diferentes do senso comum, ou que estão em situação de vulnerabilidade.

No entanto, a sanha punitivista não foi capaz de frear a ação de sites racistas e fascistas que incitam ódio, e que estão por trás deste e do atendado de Realengo, por terem sido procurados pelos autores dos ataques para conseguirem armas. Tanto o responsável por Realengo, como este, são tratados como heróis nesses espaços. Uma semana antes do ocorrido, um dos atiradores publicou um agradecimento a este site pelas orientações.

Estamos presenciando um momento de cultura do ódio e culto às armas como grande política de segurança pública. Além disso, a educação vem sendo atacada como ideológica e disseminadora de um tal de “marxismo cultural” e “ideologia de gênero”. Esses discursos e práticas favorecem um ambiente de guerra, além de alastrar racismo, LGBTfobia, dentre outros comportamentos fascistas. Isso também estava presente, de algum modo, na ação desses jovens, que pelo que tem sido noticiado, faziam apologia do ódio e disseminação da cultura armamentista.

Deveríamos esperar como reação ao acontecido que os governos, locais e nacional, em contato com a comunidade escolar, pensassem em formas de acolhimento dos estudantes da escola, mas para além disso, uma política de prevenção a tais ocorrências, para que não se repetissem. E que dialogassem sobre ações reforçadoras de vínculos e não violência. Isso, acompanhado de uma educação que rechaçasse racismos e qualquer tipo de discriminação.

Porém, não há sinal algum que indique este caminho, ao contrário, os governantes e legisladores, em grande maioria, saíram buscando culpados e propondo medidas punitivistas de maneira aleatória, sem analisar o que de fato está na raiz de acontecimentos como este. O horizonte não é promissor, mas nós, como sociedade, temos de reagir de outra forma, exigindo que se vá às causas e, com isso, haja ações de longo prazo que coíbam histórias como de Suzano. Além disso, é urgente uma reação contra a cultura das armas, que é notório, só aumenta a violência e não protege, ao contrário, ameaça ainda mais.

 

*Foto: Rovena Rosa/Agência Brasil

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