Os membros do extinto Conselho Curador da Empresa Brasil de Comunicação (EBC) lançaram uma nota denunciando os impactos da Medida Provisória (MP) 744, que alterou a estrutura da empresa. Publicada pelo governo golpista de Michel Temer (PMDB) no ano passado, a MP completa um ano hoje e ainda é motivo de polêmica entre governistas, funcionários da EBC, comunicadores e outros especialistas.
A última presidenta do conselho, Rita Freire, diz que a empresa abandonou o modelo de comunicação pública, que se pauta no interesse social e coletivo. “O que está acontecendo com a EBC hoje, além do desmonte de vários setores, é servir ao governo federal como uma linha da transmissão dos seus interesses”, disse Freire.
Segundo ela, a extinção do Conselho significou o fim da livre participação da sociedade na empresa porque os membros do colegiado eram representantes de vários segmentos populares. Eles exerciam o controle social sobre a programação e o conteúdo produzido pelos veículos da EBC.
Na nota divulgada nesta sexta-feira (1º), os conselheiros denunciam, entre outras coisas, a situação em que se encontra a Rádio Nacional da Amazônia. O veículo é apontado como sendo fundamental para comunidades da região Norte e está sem sinal desde março deste ano. “Essa rádio é importante até para uma comunidade informar outra sobre algum evento, algum acontecimento grave que ela esteja enfrentando, informações do cotidiano. Ela não tem outro meio de fazer essa comunicação. O Conselho Curador jamais permitiria isso”, afirma a presidenta cassada.
Além da extinção do colegiado, a nota divulgada pelos conselheiros critica as outras mudanças trazidas pela MP. Uma delas foi a transferência da EBC para as responsabilidades da Casa Civil, que trata das articulações políticas do governo. Outra crítica recai sobre o fim do mandato do diretor-presidente da empresa – na época, Ricardo Melo. Ele havia sido nomeado por Dilma Rousseff pouco tempo antes, mas foi exonerado por Michel Temer logo após o golpe que depôs a presidenta. Em seu lugar, o governo nomeou definitivamente o jornalista Laerte Rimoli.
Antes, o mandato só poderia ser interrompido pelo Conselho Curador ou pela própria renúncia do diretor-presidente. Atualmente, com a MP, o ocupante do cargo pode ser trocado a qualquer momento, de acordo com os interesses do Palácio do Planalto. Para Ricardo Melo, que chegou a vencer uma batalha judicial no ano passado, antes de ser definitivamente deposto, a mudança atingiu diretamente o caráter público da EBC:
“A independência da EBC, o que é absolutamente indispensável e fundamental quando se fala de uma comunicação realmente plural, autônoma, apartidária e que não fique ligada aos desígnios governamentais – como ocorre, por exemplo, com a Voz do Brasil, que é simplesmente uma reprodutora dos atos oficias –, foi ferida de morte”, analisa o ex-diretor.
A nota dos conselheiros faz referência ainda a um “excesso de governismo” na cobertura jornalística da empresa. A crítica também é feita pela Comissão de Empregados da EBC.
“Não se discute mais pauta, quais matérias são relevantes, quais os assuntos importantes, como detalhar os assuntos, como profundar certas coberturas. O que se tem feito, via de regra, é o jornalismo oficialesco, que simplesmente dá o que o governo fala – no caso, a Presidência e os ministérios – e a base aliada no Congresso. Tudo que foge disso tem tido muita dificuldade para ser trabalhado e para ser publicado”, aponta o funcionário Ivan Richard, membro da Comissão.
O problema tem sido exposto também pela Ouvidoria da EBC. O órgão tem criticado com frequência a falta de contraponto em reportagens e programas que abordam as propostas do atual governo.
Outro lado
Em nota a assessoria de imprensa da EBC disse que os veículos seguem “uma linha editorial definida em seu Manual de Jornalismo de 2003 e que as equipes têm como orientação produzir um jornalismo profissional, com noticiário plural e prestação de serviços de interesse do conjunto da sociedade”.
A respeito da situação da Rádio Nacional da Amazônia, a assessoria informou que o problema resultou de fortes descargas elétricas que danificaram os transmissores. Diante disso, a EBC comunicou que “tem feito todos os esforços possíveis para normalizar o sinal” e que estaria ciente da importância da rádio para o país.
No mais, a empresa disse que trabalha atualmente com o orçamento limitado: em vez de R$ 220 milhões para 2017, como foi anteriormente previsto, o governo reduziu os investimentos para R$ 127 milhões.