Em meio ao desmonte do país, as eleições parlamentares de 2018 trazem uma oportunidade única: a mudança do atual Congresso Nacional. Não à toa, os golpistas pressionam pela adoção do distritão, inserido na proposta de Reforma Política (PEC 77/2003), aprovada pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados na última quinta-feira (10.08).
A PEC ainda será discutida no plenário da Câmara e do Senado. Os golpistas têm pressa: precisam votar a reforma até 7 de outubro, para que ela valha em 2018, quando serão eleitos 1.059 deputados estatuais, 513 deputados federais, 54 senadores, 27 governadores e, claro, o presidente da República.
Com a adoção do “distritão”, o atual modelo de eleição proporcional seria substituído pelo majoritário. Hoje, um parlamentar é eleito a partir de um cálculo que leva em conta os votos que ele recebeu e, também, os votos totais destinados à determinada legenda ou coligação.
Com o distritão, exclui-se o coeficiente eleitoral e só são contabilizados os votos individuais. Neste sentido, sua adoção enfraqueceria os partidos políticos e fortaleceria o candidato individualmente. Ao mesmo tempo, a renovação do Congresso ficaria prejudicada, na medida em que os candidatos que vão para a reeleição têm muito mais chances de se elegerem.
Parlamentares do PT, PCdoB, PDT, PR, PSOL, PHS e PRB lançaram uma frente contra o distritão no Congresso. O deputado José Guimarães (PT-CE) destaca, no site do PT, que se trata de uma frente ampla e suprapartidária do legislativo, composta por parlamentares que defendem financiamento, cláusula de desempenho, fim das coligações partidárias e renovação do atual sistema visando uma transição para o futuro.
Polêmicas
Sugerido por Eduardo Cunha, o distritão foi rejeitado na Câmara dos Deputados em 2015, mas foi incluído e aprovado pela Comissão. Além dos partidos e forças de esquerda, a medida vem sendo rechaçada por cientistas políticos e advogados e até mesmo pelos procuradores da Lava Jato.
Para passar o distritão, os golpistas vendem sua transição para um modelo distrital misto, que valeria para as eleições parlamentares de 2022. O voto distrital misto permite que o eleitor vote no candidato do distrito e, também, em uma lista pré-determinada, divulgada pelos partidos políticos. É eleito o primeiro candidato de cada distrito e, também, os parlamentares dos partidos mais votados.
O senador Eunício Oliveira (PMDB-CE), presidente do Congresso, sustenta que o TSE teria dificuldades em criar os distritos eleitorais nas eleições do próximo ano. “Deve ser votado o distritão em 2018, mas, na mesma cláusula do distritão, já tem a definição de que a próxima eleição se dará com o voto distrital misto”, promete. Quem, nesta altura do campeonato, acreditaria em promessas como esta?
Outro ponto polêmico diz respeito à cláusula de barreiras. Segundo a proposta, para que os partidos possam ter acesso ao fundo partidário, tempo de TV e liderança na Câmara e no Senado, seriam necessários 2% de votos para deputado federal em 14 estados brasileiros. Em seu site, o PSOL qualifica a proposta como o “ovo da serpente” da atual reforma.
“Há medidas alternativas sendo negociadas, mas toda cláusula de barreira é um ataque à livre organização política, direito fundamental a ser defendido no país. Há outras formas de diminuir o fisiologismo dos partidos de aluguel, como o próprio fim das coligações proporcionais”, afirma a legenda.
No portal Vermelho, do PC do B, Haroldo Lima, membro da Comissão Política do Comitê Central do Partido Comunista do Brasil e ex-deputado federal pela legenda, destaca que “a resistência democrática sempre impediu que a [cláusula de barreira] fosse aplicada nos termos previstos”.
A cláusula de barreira de 5% ingressou na vida política brasileira como a “cláusula de barreira de 10%, da Constituição de 1967, outorgada pela ditadura; evoluiu para a cláusula de barreira de 5%, da Constituição de 1969, da Junta Militar; e foi confirmada, anos depois, pelo Pacote de Abril de 1977, do general Geisel, o mesmo pacote que fechou o Congresso e criou os senadores biônicos”, aponta.
Em sua avaliação, “a batalha está em curso, mas, derrotar o “distritão” no plenário da Câmara dos Deputados, talvez seja dos objetivos mais importantes que as forças democráticas teriam que cumprir”.
Financiamento público de campanha
Outra polêmica, particularmente incensada pela mídia, é a criação do Fundo Especial de Financiamento da Democracia. Este fundo seria administrado pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e composto por 0,5% da soma das receitas tributárias do governo. O valor destinado exclusivamente para financiar as campanhas eleitorais dependeria da receita fechada 12 meses em relação ao junho anterior à eleição. Em 2018, por exemplo, seriam investidos R$ 3,6 bilhões.
A proposta garante a manutenção do Fundo Partidário – em torno de R$ 800 milhões atuais – e outros recursos financeiros definidos por lei. Em relação ao Fundo, 2% seria dividido igualmente entre os 35 partidos e o restante (98%) de forma proporcional à votação que seus candidatos a deputado federal obtiveram nas eleições de 2014.
A medida vem sendo apresentada como uma alternativa de financiamento das eleições no país, após a proibição do financiamento privado de campanha, conquistada em 2015, apesar de todos os esforços contrários do ministro Gilmar Mendes. Segundo reportagem do DW Brasil, 188 países contam com algum tipo de financiamento público, como Alemanha, Estados Unidos, México e França.
A reportagem, inclusive, considera a importância do fundo na diminuição da interferência eleitoral nas eleições, mas alerta sobre a necessidade de haver outras fontes de financiamento evitando “dependência excessiva do Estado” e, sobretudo, uma “fiscalização severa”. Sobre a questão, vale destacar o alerta do cientista político Pedro Cavalcante, em artigo publicado no GGN.
Segundo ele, a assimetria do poder econômico nas eleições ainda permanece, na medida em que a proposta permite doações de pessoas físicas ou autofinanciamento dos candidatos em até 10% da renda declarada no ano anterior.
“Enquanto o grande empresário ou ruralista poderá doar milhões a sua campanha, as doações de representantes de segmentos menos abastados se restringem ao fundo público ou às doações individuais, historicamente irrelevantes no Brasil”, avalia.
Ele lembra, também, que em 2016, por meio de doações pessoais de seus executivos, as empresas continuaram financiando campanhas de prefeitos ou vereadores.
Outras medidas
A reforma política em debate nesta semana também mexe com o Judiciário. Uma das propostas é a adoção do mandato de dez anos para ministros do STF, do Tribunal de Contas da União (TCU) e dos tribunais superiores. Cargos hoje, praticamente vitalícios, ao permitirem que seus titulares permaneçam até os 75 anos de idade.
Os 10 anos de mandato valeriam apenas para novos ministros. Já nos tribunais de contas estaduais e municipais e nos tribunais regionais federais e do estado, o mandato seria de quatro anos.
Também está em discussão a extinção dos cargos de vice-presidente da República, vice-governador e vice-prefeito; e dos suplentes dos senadores. Uma pauta retirada pelos parlamentares durante a votação da Reforma na Comissão, mas incluída novamente pela oposição.