Papa Francisco aos movimentos populares: transformar estruturas para uma vida digna

Em seu discurso – depois de saudar e agradecer carinhosamente os participantes do 3º Encontro Mundial dos Movimentos Populares, em novembro, no Vaticano – o Papa Francisco recordou o 2º Encontro. Nesta lembrança, destaco o primeiro ponto marcante na fala dele: a necessidade de uma mudança de estruturas para que a vida seja digna.

“No nosso último encontro na Bolívia – disse Francisco – com a maioria de latino-americanos, pudemos falar da necessidade de uma mudança para que a vida seja digna, uma transformação de estruturas; além disso, do modo como vocês, movimentos populares, são semeadores de mudança, promotores de um processo para o qual convergem milhões de pequenas e grandes ações interligadas de modo criativo, como numa poesia. Foi por isso que quis chamar vocês de ‘poetas sociais’. E também pudemos enumerar algumas tarefas imprescindíveis para caminhar rumo a uma alternativa humana diante da globalização da indiferença: pôr a economia ao serviço dos povos; construir a paz e a justiça; defender a Mãe Terra.”

De coração aberto, o Papa lembrou: “Naquele dia, com a voz de uma ‘cartonera’ e de um camponês, na conclusão foram lidos os dez pontos de Santa Cruz de la Sierra, onde a palavra ‘mudança’ estava carregada de um grande conteúdo, ligada às coisas fundamentais que vocês reivindicam: trabalho digno para todas as pessoas excluídas do mercado de trabalho; terra para os camponeses e as populações indígenas; habitações para as famílias desabrigadas; integração urbana para os bairros populares; eliminação da discriminação, da violência contra as mulheres e das novas formas de escravidão; fim de todas as guerras, do crime organizado e da repressão; liberdade de expressão e de comunicação democrática; ciência e tecnologia ao serviço dos povos”.

Francisco disse ainda: “Ouvimos também como vocês se comprometeram a abraçar um projeto de vida que rejeite o consumismo e recupere a solidariedade, o amor entre nós e o respeito pela natureza como valores essenciais. É a felicidade de ‘viver bem’ aquilo que vocês reclamam, a ‘vida boa’, e não aquele ideal egoísta que enganosamente inverte as palavras e propõe a ‘boa vida’”.

Reparem como o Papa se coloca no meio dos movimentos populares: como um irmão que confia neles e conta com eles.

Francisco reconhece e respeita a diversidade e as diferenças como um grande valor. “Nós que hoje estamos aqui, de diferentes origens, credos e ideias, talvez não estejamos de acordo acerca de tudo, certamente pensamos de modo diverso sobre muitas coisas, mas sem dúvida estamos de acordo sobre estes pontos”.

Mostrando que acompanha e é “próximo” da caminhada e da luta dos movimentos populares, o Papa declara: “Sei também que foram realizados encontros e laboratórios em vários países, onde se multiplicaram os debates à luz da realidade de cada comunidade. Isto é muito importante, porque as soluções reais para as problemáticas atuais não sairão de uma, três ou mil conferências: elas devem ser fruto de um discernimento coletivo que amadurece nos territórios juntamente com os irmãos, um discernimento que se torna ação transformadora ‘em conformidade com os lugares, os tempos e as pessoas’, como dizia Santo Inácio. Caso contrário, corremos o risco das abstrações, de certos ‘nominalismos declaracionistas’ (slogans), que são frases bonitas, mas que não conseguem sustentar a vida das nossas comunidades’ (Carta ao Presidente da Pontifícia Comissão para a América Latina, 19 de março de 2016). São slogans! O colonialismo ideológico globalizador procura impor receitas supraculturais que não respeitam a identidade dos povos”. Reparem, mais uma vez, como o Papa é objetivo e claro em suas palavras.

Francisco elogia e aprecia a capacidade de discernimento dos movimentos populares: “Vocês caminham por outra vereda que é local e, ao mesmo tempo, universal. Um caminho que me recorda como Jesus pediu para dispor a multidão em grupos de cinquenta, para lhes distribuir o pão (cf. Homilia na Solenidade do Corpus Christi, Buenos Aires, 12 de junho de 2004)”.

Com toda ternura e fraternidade, o Papa faz elogios à luta, à persistência e à coragem dos movimentos populares. Tem por eles muita admiração e palavras de incentivo que brotam do mais profundo de suas entranhas.

“Há pouco assistimos ao vídeo que vocês apresentaram como conclusão deste 3º Encontro. Vimos os rostos de vocês nos debates sobre o modo de enfrentar ‘a desigualdade que gera violência’. Tantas propostas, muita criatividade e grande esperança na voz de vocês, que talvez tivesse mais motivos para se queixar, permanecer emudecida nos conflitos, cair na tentação do negativo. E, no entanto, vocês olham para a frente, pensam, debatem, propõem e agem. Congratulo-me com vocês, acompanho vocês e peço-lhes que continuem a abrir caminhos e a lutar. Isto me dá força, dá-nos força. Penso que este nosso diálogo, que se acrescenta aos esforços de muitos milhões de pessoas que trabalham diariamente pela justiça no mundo inteiro, começa a ganhar raízes”.

Quanta sinceridade e quanta empatia para com os movimentos populares Francisco revela em suas palavras. Realmente, ele é uma pessoa de uma sensibilidade humana e cristã muito profunda. Vive a radicalidade do seguimento de Jesus de Nazaré e – como um verdadeiro pastor e profeta – enfrenta com coragem os desafios do mundo de hoje. E nós, meditemos!

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