O combate à corrupção não pode resultar da supressão de direitos previstos na Constituição. É o que defende a Defensoria Pública do Estado do Rio de Janeiro em um documento que analisa as 10 Medidas Contra a Corrupção – projeto de lei de iniciativa popular, atualmente em discussão no Congresso.
As 10 Medidas foram elaboradas pelo Ministério Público Federal no decorrer da Operação Lava Jato, que há mais de dois anos investiga uma série de desvios na Petrobras e em outras empresas públicas para financiar campanhas. O pacote, que prevê uma série de alterações legislativas sob a justificativa de tornar mais efetivo o combate à corrupção, chegou ao Congresso após obter dois milhões e meio de assinaturas.
A Defensoria Pública do Rio analisou o pacote de medidas e constatou que muitas implicam supressão de direitos e repercutem em toda a população. O defensor público-geral do Rio, André Castro, vê com preocupação algumas propostas previstas no pacote. Ele ressaltou que a Defensoria é contra a corrupção, mas o combate a esse crime não se faz com a redução de direitos nem com a fragilização do Estado Democrático.
Ele citou como exemplo disso o teste de integridade para servidores públicos, que o projeto prevê que só pode ser aplicado com a anuência do MP. Na avaliação do defensor, combinada com as denúncias anônimas também propostas pelo pacote legislativo, a medida criará um clima de desconfiança generalizada na administração pública.
Outra medida que o defensor público-geral vê com preocupação é a que autoriza a prisão preventiva do acusado até a devolução do dinheiro desviado. Para Castro, a proposta fere a presunção de inocência garantida na Constituição.
– Ainda não está provado que a pessoa desviou aqueles recursos e, no entanto, prevê-se a prisão provisória para esse fim. Isso é grave, pois se antecipa o cumprimento de uma eventual pena – destacou.
Repercussão das medidas
A análise das 10 Medidas contou com a participação de diversos defensores públicos do Rio. Todos frisam a importância do combate à corrupção e da importância da iniciativa. Porém, ressaltam a necessidade de algumas propostas sem ajustadas ou mesmo a revogadas.
É o caso da medida “Ajustes na Prescrição Penal Contra a Impunidade e a Corrupção”, que objetiva a alteração do artigo 110 do Código Penal para aumentar em um terço o prazo da prescrição – ou seja, do tempo que o Estado dispõe para julgar e punir uma pessoa que praticou um crime.
Ao analisar a proposta, o defensor público Eduardo Castro destacou que “a prescrição é uma garantia constitucional de qualquer cidadão que, justa ou injustamente, tenha sido acusado de cometer um delito, contra uma possível sujeição eterna ao poder punitivo estatal”.
– Muito mais do que uma ferramenta que obste a eternização dos processos, a prescrição legitima o princípio constitucional da duração razoável do processo – afirmou.
Outra medida analisada pela DPRJ foi a “Eficiência dos Recursos no Processo Penal”, que proíbe a utilização dos recursos nos casos em que for considerada abusivo e com a finalidade de atrasar o julgamento final da ação penal. Na análise que fez sobre a proposta, a defensora Elisa Cruz lembrou que o recurso é válido para todo tipo de processo (administrativo, cível e penal) e tem previsão na Constituição.
– Como poderíamos considerar ilícito ou inadequado o uso de um recurso que é considerado pelo acusado como essencial para provar sua inocência ou seu direito a uma pena menor? – afirmou a defensora.
Segundo Elisa, uma pesquisa realizada junto ao Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal mostrou que em 41% dos recursos da Defensoria Pública do Rio de Janeiro e em 64% dos recursos da Defensoria Pública de São Paulo foram reconhecidas alguma injustiça.
– Isso significa que graças a insistência na interposição de recursos, uma grande quantidade de pessoas conseguiu mudar a sentença de um juiz e conseguir que a Constituição e a lei fossem aplicadas da forma correta – ressaltou a defensora.
Confira o estudo na íntegra: https://goo.gl/kSIqtf