Três anos da Lei de Acesso: avanços e tropeços

 

Por Nicole Verillo

No último dia 16, a Lei de Acesso à Informação (LAI) completou três anos em vigor. Apesar de o aniversário trazer motivos para se comemorar, a festa poderia (e deveria) ser bem maior. O Brasil foi o 89º país a adotar uma Lei de Acesso à Informação Pública e fez isso de forma ambiciosa. Nossa LAI está entre as 20 mais rigorosas do mundo, segundo o Global Rightto Information Ranking. Com a Lei, o acesso é a regra e o sigilo (deveria ser) a exceção. De fato, aos poucos, o acesso está se tornado a regra, mas o sigilo ainda é muito presente.

O nível de transparência entre os diferentes poderes e entre os diferentes níveis de governo ainda é muito destoante. O maior desafio segue sendo superar a cultura de sigilo dentro de diversos órgãos públicos que insistem em fazer uma gestão privada da informação pública, fornecendo acesso à informação de acordo com o humor e o interesse dos gestores, ignorando o fato de que a informação é um bem público.

ARTIGO 19 lançou na última semana seu relatório anual que monitora a aplicação da LAI no Brasil. O estudo “Monitoramento da Lei de Acesso à Informação Pública em 2014” analisou 51 órgãos públicos federais do Executivo, Legislativo e da Justiça.

De forma geral, houve avanços e os órgãos estão disponibilizando informação de forma mais proativa em seus sites (Transparência Ativa). Um destaque é a melhora considerável da divulgação sobre informações institucionais, “perguntas e respostas frequentes” e notícias sobre a realização de audiências públicas e consultas populares no Executivo do governo federal. O governo federal também tem feito movimentos relevantes no que diz respeito a dados abertos, criando o Portal Brasileiro de Dados Abertos que pretende fornecer todo e qualquer tipo de dado produzido pelo governo.

Já na avaliação sobre como os órgãos públicos respondem pedidos formais de informação (Transparência Passiva) o avanço foi mais tímido. Muitos pedidos feitos pela ARTIGO 19 ficaram sem respostas, órgãos exigiram justificativas e documentos (o que a Lei proíbe), e foi necessário entrar com recurso diversas vezes para se conseguir a informação.

Com esse cenário muito aquém do ideal no nível federal, não é nenhuma surpresa que no nível estadual e municipal a situação seja mais preocupante ainda.

Após três anos, a Lei de Acesso à Informação ainda sequer foi regulamentada em cinco estados e cinco capitais: Amapá, Amazonas, Pará, Rio Grande do Norte, Roraima, Aracaju, Boa Vista, Macapá, Porto Velho e São Luís. Nos municípios acima de 100 mil habitantes, apenas em 36% deles (incluindo capitais) foi localizada a regulamentação. Além disso, 62% dos municípios avaliados pela Escala Brasil Transparente (EBT), da Controladoria-Geral da União (CGU) que mede o grau de cumprimento às normas da Lei de Acesso, obtiveram nota zero.

Não regulamentar a Lei dificulta sua aplicabilidade localmente, uma vez que, apesar de a lei federal já garantir o direito de acesso ao cidadão, é através da regulamentação que se definem as instâncias recursais, a criação de um serviço de informações ao cidadão com as condições apropriadas para atender e orientar a população, protocolizar requerimentos etc.

É verdade que alguns municípios têm demonstrado real comprometimento com a LAI e apresentado ferramentas inovadoras para garantir a transparência e o acesso à informação. Muitos adotaram as normas necessárias e criaram instâncias internas, salas e portais de informação ao cidadão, como a cidade de São Paulo, que está desenvolvendo uma série de iniciativas para fomentar um governo aberto com participação social e inovação tecnológica. Mas a grande maioria das localidades ainda anda longe da letra da lei.

Para mudar esse cenário a cobrança da sociedade é fundamental. Nessa linha, a CGU iniciou nas redes sociais a campanha “Eu quero a Lei de Acesso regulamentada em todos os estados do país”. A iniciativa visa unir cidadãos para que o direito de acesso à informação seja regulamentado em todas as 27 unidades federativas do Brasil. Apesar da campanha ser voltada aos estados, ela também vale para municípios, pois a regulamentação é uma obrigação de todos estados, municípios e poderes, como dita a Lei Federal.

De qualquer forma, com ou sem a regulamentação no seu estado e município, o fato é que o direito à informação já está valendo para todo o país. A ausência da regulamentação local prejudica muito, mas não impede o direito de acesso à informação e o cumprimento da lei. Por isso, a campanha também alerta que todo cidadão pode (e deve!) acionar o Ministério Público e o Tribunal de Contas locais, quando o seu direito de acesso for negado.

Além disso, a regulamentação é só o primeiro passo e, infelizmente, a legislação por si só não é suficiente para construir uma cultura de transparência. E a Lei vai muito além do que uma simples questão de legalidade, éuma questão de espírito público da gestão.

Engana-se o gestor que acha que essa temática de transparência é uma coisa passageira. Políticos e administradores públicos precisam querer mostrar como vai sua gestão de forma transparente e compreensível, não basta só disponibilizar qualquer informação. Não é cabível que ainda haja administradores públicos sonegando informações e documentos que, na realidade, pertencem à sociedade. Qual é o problema em prestar contas se você é um gestor honesto? O fato é que nos rincões do Brasil a maioria não divulga porque tem medo do que se pode descobrir.

E é exatamente por esse motivo, somada a extensão territorial continental do nosso país, que insisto na importância da sociedade civil se mobilizar para exigir e monitorar a implementação da LAI em seus municípios.

Informação é poder, não abra mão desse direito.

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