Último indígena no Congresso deixou cargo há 28 anos

Desde que o cacique xavante Mário Juruna deixou o Congresso Nacional, no fim de 1986, nunca mais o país teve um índio no parlamento. Com uma popula­ção de 890 mil pessoas, os indígenas re­presentam cerca de 0,4% da população brasileira, proporção que não se repete nos espaços de poder.

Dos 25.919 candidatos e candidatas, apenas 83 são indígenas em todo o país, sendo 51 candidatos a deputado estadu­al, 24 a deputado federal e apenas 3 pa­ra o Senado. Para presidente da Repú­blica e governador de estado, não há ne­nhum candidato indígena. Nem mesmo entre os vice.

No Brasil, existem pelo menos 305 po­vos, com 274 línguas diferentes faladas, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

A valorização dos conhecimentos e tra­dições de povos tradicionais, que envolve várias gerações dentro das aldeias pode fortalecer as comunidades, preservando a riqueza dessas culturas. É o que defen­de Sonia Guajajara, da Coordenação exe­cutiva da Articulação dos Povos Indíge­nas do Brasil (APIB).

“Para nós é mesmo uma questão de re­afirmação da identidade. Se a gente tives­se a nossa representação indígena dentro do parlamento, a gente poderia contri­buir muito inclusive para o Brasil reco­nhecer e respeitar essa diversidade étni­ca, cultural”, sugere.

Marcos Tupã, Coordenador da Comis­são Guarari Yvyrupa, considera necessá­rio que o país garanta representação das populações tradicionais no Parlamento como forma de expressar as reivindica­ções específicas.

“O Brasil é pluricultural. Deveria res­peitar a Constituição Federal. E toda ho­ra, todo momento os parlamentares an­ti-indígena estão apresentando propos­tas e projetos de lei para mudar a Cons­tituição e muitas vezes estão batendo de frente com a legislação já garantida.”

Reforma política

Sonia Guajajara fala da urgência de o Brasil corrigir essa distorção marca­da pela sub-representação nos espaços institucionais, pois “somente uma mu­dança no sistema político pode ser bem sucedido. Só um representante indíge­na mesmo pode fazer essa defesa com legitimidade.”

A capacidade de proposição dos indí­genas não se limita a pautas específicas. Tupã destaca que é possível contribuir em todas as áreas relacionadas ao desen­volvimento do país.

“Nós temos condição de discutir meio ambiente e conservação. Infelizmente a questão econômica e o capitalismo aca­bam engolindo os menos favorecidos porque a maioria das questões envol­ve interesses financeiros para empre­sas e representantes do agronegócio”, comenta Tupã.

País racista e excludente

Com a sub-representação, a garantia de direitos dos indígenas tem ficado re­fém da influência de setores do agrone­gócio e da mineração. A ofensiva sobre os Territórios Indígenas resulta em aumen­to dos conflitos no campo.

As populações indígenas têm sido ex­cluídas dos processos de tomada de de­cisão. Além disso, em muitos casos, são frequentemente tratadas de forma pe­jorativa e discriminatória. Para a inte­grante da APIB, a exclusão é uma for­ma de racismo.

“O Brasil demonstra que a ordem que se prega é excluir essas representações das minorias, tanto de indígenas como de negros e mulheres. Aí fica muito claro que o que manda mesmo é o poder eco­nômico, o dinheiro. Fica declarado um país racista e excludente.”

Este ano, no estado de Roraima, em as­sembleia na reserva Raposa Serra do Sol, caciques de diversas etnias iniciaram uma articulação para eleger dois deputa­dos, um federal e um estadual.

Roraima é o estado que proporcional­mente possui a maior população indíge­na no país. Segundo o último Censo do IBGE, dos 450 mil habitantes do estado, 49,6 mil se declaram indígenas. A articu­lação busca levar um indígena ao Con­gresso depois de 28 anos sem um repre­sentante genuíno.

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