Mudança no orçamento impede controle social

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Igualdade sem orçamento é papo sem fundamento! Com essa convicção, os movimentos de mulheres, há vários anos, são vozes importantes no debate político sobre Orçamento Público. Em âmbito nacional, a incidência política feminista e antirracista tem se mostrado indispensável para imprimir na agenda das finanças públicas o desafio do enfrentamento das desigualdades.

Sabemos que para orientar o Orçamento Público para a igualdade temos que ter poder. Por isso mesmo, ter informação é básico e indispensável. O movimento de mulheres quer ter poder para decidir sobre onde o Estado vai investir o dinheiro recolhido dos nossos impostos. Para isso, reivindica transparência, participação e controle social na elaboração dos orçamentos públicos, na sua execução e também na prestação de contas sobre os resultados alcançados. Essa demanda está clara e evidente em todas as Conferências de Políticas para as Mulheres.

O Brasil se tornou o único país do mundo a oferecer acesso público e gratuito aos dados oficiais sobre a execução orçamentária das ações do governo voltadas para as mulheres e o enfrentamento das desigualdades, porque nós, do movimento de mulheres, lutamos muito para democratizar o processo orçamentário.

Desde 2005, o SigaBrasil – Portal do Orçamento do Senado Federal, disponibiliza o Orçamento Mulher, atualizado diariamente. Lá está a execução de cada uma das ações orçamentárias compromissadas com o financiamento do Plano Nacional de Políticas para as Mulheres e outras selecionadas no orçamento da União. Essa é uma iniciativa relevante para a democratização da esfera política de debate sobre o orçamento. E ela foi criada pela conjunção de esforços do Senado Federal, Cfemea e Secretaria de Políticas para as Mulheres.

Agora, essa e tantas outras conquistas estão em risco. Uma medida “de âmbito gerencial” do Ministério do Planejamento (MTO 2013 – Manual Técnico do Orçamento 2013) orienta a revisão de todas as ações orçamentárias atuais, para “evidenciar no orçamento somente as que entregam produtos e serviços finais à sociedade ou ao Estado”. A consequência mais grave dessa decisão política (traduzida num instrumento gerencial) do Planejamento é a perda da transparência no processo de elaboração e monitoramento das despesas públicas. A proposta vai agregar muitas ações e vai prejudicar de maneira ainda mais severa a transparência sobre os recursos alocados em serviços públicos como saúde, segurança, assistência social etc.

A informação sobre a destinação dos recursos – que se tornou poder nas mãos da cidadania de uma maneira geral e do movimento de mulheres em particular – vai ficar fora do nosso alcance. A dimensão política do debate e dos conflitos em torno das prioridades na alocação dos recursos públicos vai ficar extremamente prejudicada.

As ações orçamentárias vão ser agregadas de tal forma que, se conseguirmos apoio para aprovar uma emenda para uma política de saúde da mulher, por exemplo, nunca saberemos se o dinheiro foi todo para a gestão da política ou para o atendimento às mulheres. Descobrir onde está sendo gasto o dinheiro das políticas sociais vai ficar impossível ou, no mínimo, muito mais complexo do que já é.

Deste modo, o governo vai fragilizar ainda mais o Orçamento como instrumento político e democrático. Vai torná-lo praticamente inalcançável à cidadania, às entidades e aos movimentos sociais. É exclusão política, produzida pela negação de informação, eliminação do debate político pela burocracia e alta tecnicização dos instrumentos de gestão orçamentária e financeira. Resultado: mais poder nas mãos do Executivo para decidir sobre as finanças públicas.

Em proporção inversa, significa menos poder para os organismos de controle externo (Congresso Nacional, Tribunal de Contas da União), controle social e para a mídia. Muito pior ainda para a cidadania e os movimentos sociais, que só recentemente conseguiram espaços muito limitados de incidência nesse processo.

De fato, essa medida do Ministério do Planejamento Orçamento e Gestão de “âmbito gerencial” é tão política que inviabiliza a participação e controle social sobre a elaboração e a execução do orçamento.

É preciso que o governo recolha esse “manual técnico” e, em seu lugar, apresente a sua proposta política para um debate democrático. O movimento de mulheres, entre tantos outros, quer ter a oportunidade de discutir e se opor, política e democraticamente, a essa e outras medidas. O Congresso não pode aceitar a supressão das ferramentas que lhe permitem fazer o controle externo dos gastos do governo. E a mídia, por sua vez, também precisa se dar conta do retrocesso democrático que está sendo realizado.

Nossa Constituição cidadã nos assegurou o direito à transparência e à participação no processo orçamentário da União. Queremos participar e, mais que isso, trazer uma perspectiva feminista e antirracista para o planejamento governamental. Queremos que o Orçamento da União de 2013 priorize os recursos para o enfrentamento das desigualdades e registre, no SIAFI, todos os gastos públicos executados em cumprimento ao Plano Nacional de Políticas para as Mulheres.

Lutamos por avanços e contra retrocessos, em relação às finanças públicas. Por isso, exigimos que a discussão sobre o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias para 2013, em pauta no Congresso, inclua essa agenda e abra a oportunidade ao debate político, até aqui fechado. Demandamos uma Audiência Publica na Comissão Mista de Orçamento para debater as implicações e consequências dessa medida e, por outro lado, discutir alternativas para melhorar e ampliar o acesso às informações orçamentárias para o controle social e a cidadania de modo geral.

Quanto mais elitizadas, “técnicas” e excludentes forem as decisões sobre o Orçamento Público, mais injustas elas serão e mais desigualdades produzirão. Alegam que haverá maior eficácia, mas eficácia sem democracia não serve para quem luta por justiça e igualdade. Para nós, por princípio, democratizar o debate e as decisões sobre as finanças públicas, fortalecer a participação e controle social nesse campo é indispensável para a efetividade das ações voltadas a superar a pobreza, eliminar as desigualdades e promover justiça.

Guacira César de Oliveira – Socióloga e integrante do Colegiado de Gestão do Centro Feminista de Estudos e Assessoria (Cfemea)

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