Alternativa de Reforma Política

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Representação independente ou com possibilidade de intervenção popular?

Podemos observar que o modelo de representação do Brasil concede um alto grau de independência aos representantes, frente aos representados, ao longo do exercício dos mandatos. Consequentemente a tendência maior é que os representantes controlem os eleitores e não contrário. A possibilidade de que a cada quatro anos a população escolha diretamente os seus representantes reduz a independência em função do pressuposto desejo de reeleição. Contudo, tal desejo é um elemento subjetivo. Após eleito, o representante possui, hoje, total liberdade tanto para a defesa dos interesses dos seus eleitores, quanto de interesses supostamente opostos, na visão dominante do mandato representativo, o representante não se deve guiar nem pelos interesses de seus eleitores, nem pelos de quaisquer outros grupos, mas pelos interesses da sociedade em geral. O recurso aos dispositivos constitucionais de iniciativa popular, referendo e plebiscito é sempre intermediado pelo poder legislativo, que determina a pauta, momento e forma de execução, garantindo assim a independência do poder legislativo frente à vontade popular mesmo nesses casos.

Propomos uma forma de representação que possua a possibilidade de intervenção popular sobre o mandado e em que, portanto, os representantes sejam menos independentes em relação à população. O principal elemento de controle popular seria a possibilidade de revogação do mandato por iniciativa de eleitores. Obviamente tal inovação legal não eliminaria totalmente a independência do mandato, mas daria instrumentos jurídicos significativos de controle para a população.

Sistema Proporcional ou Distrital?

O atual sistema proporcional possui grandes distorções. Uma delas é a possibilidade do eleitor fazer campanha para um candidato e ser surpreendido por ter contribuído com a eleição de pessoas para ele extremamente indesejáveis. Entretanto, temos observado que a principal desvantagem do sistema proporcional está na dificuldade de se propor uma forma democrática de revogação do mandato por parte dos eleitores. Em um estado, por exemplo, que hipoteticamente tenha 28 milhões de eleitores e 70 deputados federais, 400 mil votos garante a eleição de um candidato. Para revogar democraticamente o mandato de um deputado federal, dentro da lógica do sistema proporcional, seria necessário garantir que ele não tenha 400 mil eleitores defendendo a manutenção do seu mandato. Logo, 27.600.001 eleitores teriam que manifestar desejo de revogar aquele mandato. Naturalmente seria um esforço muito maior que o benefício.

Para viabilizar uma obrigatoriedade de prestação de contas e revogação de mandato por parte dos eleitores, uma alternativa é a organização de distritos eleitorais e a eleição de um candidato por distrito. O estado hipotético seria dividido em 70 regiões que elegeriam apenas um deputado federal cada. Dessa forma, 50% dos eleitores mais um, daquela região, poderiam revogar o mandato.

Listas Partidárias Pré-Ordenadas

Uma alternativa apresentada para tentar corrigir as distorções do sistema proporcional é o sistema de lista partidária pré-ordenada, que, por um lado, contribui para amenizar o personalismo, dentre outras vantagens, por outro, tira do eleitor o poder de determinar a ordem da lista através do voto. Além disso, existem várias propostas que desejam pré-determinar os critérios pelos quais os partidos deverão construir suas listas. Naturalmente isso diminuiria a liberdade da sociedade de se organizar partidariamente da forma como desejar. Com base nesses aspectos podemos dizer que a proposta de lista pré-ordenada tornaria o sistema menos democrático.

Um ponto que pesa bastante a favor da lista pré-ordenada é a perspectiva de redução dos custos de campanha. Acredita-se que a somatória dos custos das campanhas individuais ficaria muito maior que o custo de uma campanha com lista fechada. Talvez esse aspecto tornasse a lista pré-ordenada um avanço significativo.

Independente desses pontos a questão central é que se continuaria sem a possibilidade da revogação de mandato por parte dos eleitores, ao contrário do que aconteceria no sistema distrital.

 

Sobre a representação e pleitos de grupos numericamente pequenos na sociedade

Um dos aspectos que pesam a favor do sistema proporcional em relação ao distrital é a possibilidade de representação de grupos de alguma relevância numérica no conjunto da população, mas espalhados pelas diversas regiões, pois esses grupos não elegeriam representantes em nenhum distrito uninominal, embora os elegessem em uma circunscrição de maior magnitude, pelo método proporcional. Realmente, pela razão indicada, o sistema proporcional é superior ao distrital, se neste não existe a possibilidade de revogação do mandato por iniciativa de eleitores.

Contudo, acredito que a representação da minoria é pouco ou nada produtiva em um modelo onde nem mesmo a vontade da maioria está sendo considerada. Ora, tem sido fácil para o poder econômico cooptar, subversiva ou explicitamente, deputados e senadores para aprovação de suas proposições ou até mesmo os controlar por ameaças de uso da violência contra ele ou sua família em casos mais extremos. Entretanto, é muito mais difícil a cooptação e o uso da força sobre a maioria da população brasileira. E, sem instrumentos de controle sobre seus representantes, a população não tem a possibilidade jurídica de intervenção na política.

Outro aspecto a ser considerado é a proposta de obrigatoriedade dos espaços e momentos de prestação de contas, que complementa defesa da adoção de distritos eleitorais uninominais. Os representantes teriam de se reunir regularmente com os eleitores de seu distrito para avaliação da conjuntura e prestação de contas. As questões ligadas aos grupos numericamente pequenos, mas que são justas reivindicações, e assim podem ser compreendidas pelo restante da sociedade, ganham força nesses momentos. Não somente pela cobrança aos representantes, mas também pela troca de informações entre os distintos setores sociais, o que pode ajudar na formação política de todos, bem como pela construção coletiva de determinados pleitos, tornando o debate bastante rico.

Conclusão

Hoje o poder legislativo é acusado de representar os interesses de um pequeno grupo que detém o poder econômico em detrimento dos interesses da maioria da população. O sistema de representação independente reduz a possibilidade de participação popular ao momento eleitoral, pois não existem instrumentos jurídicos que possibilitem qualquer intervenção popular impositiva durante o período do mandato.

Diante desse cenário propomos uma reforma política que contemple elementos jurídicos que permitiriam alguma intervenção popular impositiva, em momentos de prestação de contas obrigatórias e a possibilidade de revogação do mandato por iniciativa de eleitores.

Para viabilizar a construção de tais elementos, se faz necessária a construção de um sistema distrital, conforme apresentamos.

Alternativas apresentadas no debate em curso, como a lista partidária pré-ordenada, não contemplam instrumentos jurídicos de intervenção popular.

A possibilidade, dentro do sistema proporcional, de se eleger representantes de grupos numericamente pequenos espalhados pelas diversas regiões é pouco ou nada produtiva, em um modelo onde nem mesmo a vontade da maioria está sendo considerada.

As justas reivindicações de pequenos grupos ganham força nos momentos de prestação de contas obrigatórias, pois eles possibilitam:

a) a cobrança de que os representantes defendam os interesses da população;

b) a troca de informações, o que pode ajudar na formação política tanto da população quanto dos representantes;

c) a construção coletiva de determinados pleitos, tornando o debate bastante rico.

Naturalmente críticas surgirão sobre a alternativa de reforma política apresentada e estamos abertos para dialogar sobre elas.

 

Geter Borges de Sousa é Especialista em Processo Legislativo pelo CEFOR – Centro de Treinamento da Câmara dos Deputados, e graduado em Ciências Contábeis pela Universidade Católica de Salvador. Assessor na Câmara dos Deputados, desde 2003.

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