“O povão fica de fora, não participa das decisões”

 

Militante do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos defende participação popular

Com a aprovação do Projeto de Lei 4330, conhecido como PL das terceirizações, um novo momento se apresenta para os trabalhadores brasileiros, de perda de direitos e aumento da exploração e precarização. Eliane de Moura Martin, da direção nacional do Movimento de Trabalhadoras e Trabalhadores por Direitos (MTD), fala ao Brasil de Fato sobre o momento atual na vida dos trabalhadores. Ela defende que os trabalhadores – tanto precarizados como sindicalizados – precisam se unir para pressionar para a manutenção e aprofundamento de direitos.

 

Eliane Martins – A crise é parte do sistema capitalista. É um sistema mundial que, a cada vez que vive uma crise, procura retirar do mundo do trabalho mais lucro. Nas crises, também será preciso retirar mais recursos da natureza, mais matéria prima para depois vai virar mercadoria, para então virar lucro. Quem precisa desse lucro são os grandes países, aqueles com moeda forte, forças armadas poderosas e muita tecnologia, como os EUA, a Alemanha, a China. Diante dessa crise por mais lucro, eles olham para lugares como o Brasil, a América Latina e a África e pensam: ‘Como vamos arrancar mais coisas desses países?’.Brasil de Fato – A economia no Brasil passa por um momento delicado, pois parece que há uma crise com a qual temos que lidar. O que é essa crise?

 

A presidenta Dilma foi à televisão dizer que “vivemos um momento que será difícil para o povo, mas que vai passar”. É mesmo possível vencer essa crise? Vai demorar a passar?

Esses grandes países encontram na presidenta Dilma um problema, porque ela assinou compromissos com o povo, de manter direitos dos trabalhadores, garantir empregos. Ela foi à TV e disse que o momento difícil vai passar. Talvez seja um desejo, mas não depende exatamente da presidenta, essa questão vai para além dela. E ela vai tentar administrar a crise sob pressão. Pressão que se exerce dentro do país, por partidos como o PSDB e o DEM, e pelo grande sistema de comunicação, como a Rede Globo, que faz propaganda que o crescimento só vai acontecer se o país se subordinar ao capital internacional, aos EUA. A elite tem vantagens com essa proposta. Já o projeto que Dilma e Lula aplicaram no país nos últimos 12 anos é de melhoria da qualidade de vida do trabalhador.

 

No entanto, as medidas aplicadas e debatidas pelo Congresso e o governo desde o fim do ano passado – como as MP 664 e 665, o PL 4330 – vão em outra direção. Os trabalhadores pagarão a conta dessa crise?

O sistema capitalista precisa do desemprego, porque quanto maior ele for, mais os trabalhadores têm medo e isso faz com que eles cedam. Cedam em seus direitos, conquistas, naquilo que já acumularam ao longo dos anos. A CLT [Consolidação das Leis de Trabalho] é a legislação mais avançada que temos hoje, e está sendo atacada pela Lei da Terceirização, que vai precarizar e explorar ainda mais o trabalhador. Isso é uma ofensa às conquistas.

 

Qual é o papel dos movimentos sociais e sindicais neste momento que vive o país?

Como nós trabalhadores vamos nos organizar para defender o mínimo que já temos é o maior desafio. Deveríamos estar discutindo avanços, e não apenas a defesa do que já conquistamos. Depois de 70 anos já teríamos que estar cobrando mais direitos e não voltar atrás. Vamos voltar para 1910? Na condição de trabalhadores, nessa reflexão de movimento popular junto com sindical, está posta a necessidade de unidade da classe. Para pressionar o governo, pois a Dilma deve assumir uma posição clara em defesa dos direitos dos trabalhadores. Não devemos ter uma postura de aceitar, nossa postura deve ser crítica, de combate, de enfrentamento e luta.

 

Até que ponto os trabalhadores têm capacidade de intervir nas decisões tomadas por esse Congresso conservador?

Esse Congresso é fruto de uma herança maldita da Ditadura Militar. A transição para a democracia foi feita em andar de cima, por acordos. Para que o Congresso não dê um golpe em quem elegemos, é preciso negociar o tempo todo um projeto com o qual não se concorda. Essa herança não tem solução a não ser o debate e a construção de uma Constituinte Exclusiva para a Reforma Política. Porque não tem o que arrumar nesse negócio. O que vamos esperar de projeto de país da Bancada Ruralista, da Bancada Evangélica, da Bancada da Bala? Não há nada que se salve nesse Congresso. Devemos empunhar a bandeira da construção de uma Constituinte Exclusiva, pois o povo tem que participar dos processos de mudança na política brasileira. Nós, até aqui na história do Brasil, vivemos acertos entre as classes lá em cima, o povão fica de fora, não participa das decisões. A Constituinte Exclusiva da Reforma Política é uma bandeira política que temos que assumir e desenvolver como uma pedagogia de trabalho popular de base, para que as pessoas entendam o que isso significa, e entendam que sem a presença do povo nos processos só vamos ter mais um acordo por aí em algum lugar, e seguiremos fora da história do Brasil.

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