‘Parece que junho de 2013 não aconteceu’, diz especialista

 

Após virada conservadora nas eleições, diretor do Inesc, José Antonio Moroni, teme estagnação da luta por direitos com ascensão conservadora no Congresso e vê mobilização como essencial para avançar nas pautas sociais

por Sarah Fernandes.

Falta de clareza na motivação dos protestos pode estar ligada ao avanço conservador das eleições

São Paulo – Integrante do colegiado de gestão do Instituto de Estudo Econômicos e Sociais (Inesc), José Antonio Moroni avalia que as manifestações de junho de 2013 tiveram pouquíssimo impacto no processo eleitoral, já que as candidaturas que pautavam reformas sociais e democráticas não foram eleitas. O especialista vê com pessimismo a ascensão conservadora no Congresso Nacional e teme estagnação na luta pela conquista de direitos.

“Em relação às eleições, parece que junho de 2013 não aconteceu. As manifestações tiveram pouco impacto no processo eleitoral. Isso porque, ou nosso sistema político é tão rígido que é impermeável a qualquer tipo de manifestação popular, ou por que foi um momento conjuntural que não tinha uma agenda política clara e não foi capaz de tensionar o sistema político”, diz.

A maior prova disso, para Moroni, é que as candidaturas mais progressistas, que pautavam reformas sociais, políticas e democráticas, e que tentaram dar voz as insatisfações da população saíram enfraquecidas do processo eleitoral. “As forças políticas que teriam mais condições de dialogar com o processo de junho de 2013 não saíram fortalecidas. As pautas extremamente conservadoras foram reforçadas. O Congresso do ano que vem será mais conservador que o de hoje e assim conseguirá dar menos respostas às demandas de junho. Cristalizou o velho, no pior sentido da palavra.”

‘A governabilidade fica mais difícil com mais fragmentação no Congresso’, diz Moroni
Um dos questionamentos dos protestos, por exemplo, era a fragmentação do sistema político, com um número alto de partidos: 33 ao todo. No entanto, em 2015, o Congresso Nacional saltará dos atuais 22 partidos com representação para 28, em geral os mais ligados às oligarquias políticas, como observa Moroni.

“A governabilidade fica muito mais difícil com mais fragmentação, sem força hegemônica. A tendência vai ser de não enfrentar questões mais progressistas a não ser que tenhamos mobilização para enfrentar o Congresso”, diz. “Isso é reflexo da estratégia do PT de não ter enfrentado as reformas estruturais necessárias, como a reforma política, a democratização da mídia e a formação política da sociedade.”

No pleito eleitoral decidido ontem (5), parlamentares conservadores avançaram de maneira representativa no Legislativo federal. A bancada do PSDB na Câmara ganhou 11 cadeiras, passando de 44 para 55, um crescimento de 25%. Já a bancada do PT perdeu 20% dos deputados, passando de 88 para 70. Apesar disso, a ala petista ainda continua a maior.

No Senado, que renovou um terço da Casa, cinco dos novos 27 parlamentares são do PMDB. O PSDB e o PDT têm quatro cada, o PSB elegeu três, mesmo número do DEM, enquanto PT, PTB e PSD conseguiram eleger dois cada. PR e PP fizeram um. A maior bancada a partir de 2015 será a do PMDB, com 19. Em seguida, ficam o PT, com 13, e o PSDB, com 10.

Para o especialista, o segundo turno das eleições presidenciais tende a ser mais conservador do que o primeiro, porque tanto Aécio como Dilma vão disputar o eleitorado mais reacionário. “Independente disso, todos os direitos que avançamos na Constituinte de 1988 estarão ameaçados, seja a reforma da previdência ou a saúde e a educação pública, por exemplo. Acho que se apresenta uma conjuntura de restrições de direitos por causa do avanço conservador.”

“O conservadorismo se caracteriza por querer manter as estruturas da sociedade como estão, baseadas na desigualdade de gênero, de raça, de orientação sexual e, sobretudo, de renda. É não mexer nos mecanismos de concentração da riqueza. Os conservadores aceitaram, até certo ponto, alguma distribuição, como o Bolsa Família, contanto que não mexesse na estrutura dessa sociedade desigual”, analisa. “Com o fortalecimento desse ponto de vista nas eleições, a tendência não é só barrar qualquer avanço, mas retroceder, atacando a pauta de direitos sociais e trabalhistas, e fortalecendo o setor privado, que financia as campanhas.”

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