Patricia Facchin – IHU Online
Gustavo Porpino, graduado em Jornalismo e mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte – UFRN, e doutor em Administração pela Fundação Getulio Vargas – FGV-EAESP, analista da Secretaria de Inovação da Embrapa e líder do projeto dos Diálogos Setoriais União Europeia – Brasil sobre desperdício de alimentos enfatiza que embora tenha havido uma melhora nos índices de segurança alimentar entre 2000 e 2013, não existe “um diagnóstico abrangente sobre segurança alimentar no Brasil há seis anos, o que é preocupante se considerarmos que somos um dos maiores players do setor agropecuário mundial”.
A seguir, o pesquisador comenta as metas e as propostas do Brasil para enfrentar o desperdício e a insegurança alimentar, e pontua que o maior desafio para combater esses problemas está atrelado à possibilidade de “conseguir posicionar o tema segurança alimentar na agenda político-institucional com a importância merecida.
IHU – Como foi feita a pesquisa sobre o desperdício de alimentos no Brasil, a qual mostra que o brasileiro joga, em média, mais de 40 quilos de comida no lixo por ano?
Gustavo Porpino – A pesquisa faz parte dos Diálogos Setoriais União Europeia – Brasil, um instrumento de cooperação entre os Estados-membros da União Europeia e o Brasil em temas de interesse mútuo e alinhados com desafios globais. A Embrapa e a Fundação Getulio Vargasplanejaram a pesquisa e conseguimos ter um retrato representativo da população brasileira sobre o quanto se desperdiça nos lares brasileiros, quais os alimentos mais desperdiçados e quais fatores comportamentais contribuem para que o desperdício ocorra. O estudo foi dividido em três fases. Após a primeira fase qualitativa, na qual foram entrevistados consumidores em feiras livres e supermercados sobre hábitos de consumo de alimentos, aplicamos um questionário com 1.764 famílias e, dessa amostra, 686 preencheram um diário alimentar, no qual foi reportado ao longo de até uma semana quais alimentos eram desperdiçados. O interessante é que usamos uma plataforma móvel e os respondentes puderam fazer upload das fotos dos alimentos desperdiçados.
O que esse indicativo de 40 quilos de comida desperdiçada representa, especialmente considerando o quadro de desigualdades no país? Esse percentual é considerado elevado se comparado a outros países?
Gustavo Porpino – Se considerarmos que foi mensurado apenas o desperdício que ocorre nos domicílios, e não estamos computando os alimentos desperdiçados nas refeições feitas fora do lar, temos um indicativo de que a família brasileira típica desperdiça uma quantidade de comida semelhante às famílias dos países mais ricos da Europa, ou mesmo dos Estados Unidos, por exemplo. Para termos um índice de desperdício de alimentos global para comparar diferentes países, teríamos que utilizar a mesma metodologia de mensuração. Países europeus que utilizam análises do lixo domiciliar para quantificar o desperdício tendem a reportar desperdício acima de 40 Kg por habitante ao ano.
No Brasil, a aplicação desse método não é viável para uma pesquisa de abrangência nacional. Para o Brasil, mais do que sabermos com precisão o quanto é perdido ou desperdiçado nas diferentes etapas da cadeia agroalimentar, o mais relevante é pôr em prática ações para mudar positivamente os comportamentos que levam ao desperdício na etapa de consumo. A convivência mútua do elevado desperdício com a insegurança alimentar que persiste em algumas regiões brasileiras aponta para uma oportunidade perdida. Não necessariamente reduzir o desperdício de alimentos contribui com o combate à fome, mas ao ampliarmos a oferta de alimentos por meio da redução das perdas e do desperdício, surgem oportunidades de direcionarmos o excedente para a população mais necessitada. Aliar o combate ao desperdício de alimentos com as iniciativas de fortalecimento da segurança alimentar é o caminho a ser seguido e envolve ações ao longo de toda a cadeia produtiva, desde o campo até a mesa.
Quais são as razões que explicam esse desperdício de comida entre os brasileiros? Existe alguma correlação entre o desperdício, o poder aquisitivo e o nível de instrução das pessoas ou o desperdício independe desses fatores?
Gustavo Porpino – As famílias brasileiras tendem a valorizar a fartura na mesa. Podemos pensar na fartura como um ciclo que está presente em toda a jornada de consumo dos alimentos, desde a ida ao supermercado ou feira livre até o preparo da refeição, o modo de servir, e a administração das sobras das refeições. O mercado consumidor brasileiro é bastante segmentado, tanto em termos de renda e outras variáveis socioeconômicas quanto em termos comportamentais.
A diferença entre as famílias que desperdiçam mais e as que desperdiçam menos comida é mais bem explicada pelos fatores comportamentais, tais como planejar a compra e a refeição, não comprar alimentos em excesso, organizar bem a geladeira e a despensa, reaproveitar as sobras das refeições e, principalmente, substituir a cultura do “é melhor sobrar do que faltar” por hábitos mais frugais. Mesmo no contexto da classe média baixa existem famílias com características comportamentais que levam ao desperdício de comida. O consumidor da base da pirâmide, em particular, está sempre preocupado em economizar com a compra de alimentos, mas algumas estratégias como comprar no atacado e manter a despensa sempre cheia com os alimentos mais consumidos, tais como arroz e feijão, podem gerar mais desperdício se a família não tiver boa capacidade de planejamento das refeições e não estiver disposta a reaproveitar as sobras.
O desperdício de comida nas famílias de maior poder aquisitivo tende a ser mais diversificado e inclui, além dos alimentos mais consumidos, frutas e hortaliças, por exemplo. Famílias de menor renda tendem a ter uma dieta menos diversificada e, por consequência, o desperdício também está concentrado em menor variedade de alimentos. De modo geral, nos diferentes segmentos, o problema está mais relacionado com cozinhar demais e não aproveitar as sobras das refeições. É um problema complexo que requer mudança cultural por meio de ações de longo prazo.
Quais diria que são os hábitos alimentares dos brasileiros, de modo geral, e que tipo de alimento costuma ser mais desperdiçado?
Gustavo Porpino – Os hábitos alimentares variam muito conforme a renda, estilos de vida e outros fatores comportamentais. O segmento mais pobre está preocupado em não voltar a passar fome e tende a valorizar a fartura, porque o alimento sinaliza dignidade e riqueza. Por vezes, o consumidor de menor renda desperdiça por fatores alheios à sua vontade, como não ter recipientes adequados para acondicionar as sobras das refeições na geladeira. Mas também há o segmento que mostra preconceito com o consumo das sobras, considera as sobras das refeições como sendo “comida dormida” e tende a jogar fora o que sobrou em vez de reinventar em novos pratos.
As famílias mais ricas têm dietas mais saudáveis, valorizam modismos diversos na alimentação, mas também estão bastante segmentadas em termos de hábitos que levam ao desperdício. Captamos, na pesquisa, que os consumidores valorizam bastante o frescor dos alimentos, e, quando este hábito é combinado com a valorização da fartura, há maior propensão de descarte das sobras.
A pesquisa apontou que, de cada 1 kg desperdiçado pelas famílias, em média, 220 gramas são de arroz, 200 gramas de carne, 160 gramas de feijão e 150 gramas de frango. Estes são os mais desperdiçados na análise por quilogramas. Observamos que o desperdício de arroz e feijão tende a ser mais recorrente e o desperdício médio relativamente alto de proteína animal se dá por algumas eventualidades, tais como assar muita carne num churrasco de final de semana e não aproveitar as sobras. Hortaliças são uma categoria de alimentos na qual há relação entre renda e desperdício. As famílias de maior poder aquisitivo tendem a desperdiçar mais hortaliças, mas este resultado deriva do fato de o consumo de frutas e hortaliças no Brasil estar muito concentrado nos segmentos de maior renda. Temos aí um outro problema a ser combatido. Precisamos ampliar o consumo de frutas e hortaliças na população de baixa renda, que está mais sujeita a ser obesa e ter outras doenças derivadas da alimentação inadequada.
Desde o ano passado, algumas ONGs têm alertado para o risco de o Brasil retornar ao Mapa da Fome da ONU. Qual é o nível de insegurança alimentar no país hoje e quais são os riscos de o país voltar a fazer parte do Mapa da Fome?
Gustavo Porpino – O Brasil precisa passar a mensurar a insegurança alimentar com mais frequência e delinear planos de ação levando em conta as diferenças regionais. O último levantamento do IBGE, realizado em 2013, mostrou que 22,6% da população estavam em algum nível de insegurança alimentar: leve, moderada ou grave. As diferenças regionais são significativas. Em 2013, 20% da população rural do Nordeste enfrentava insegurança alimentar moderada ou grave, um dado alarmante, ainda mais se levarmos em conta este aparente paradoxo de a insegurança alimentar ser maior para as famílias que estão mais próximas da produção de alimentos. Temos o caso do Maranhão, por exemplo, com índice de insegurança alimentar de 60%, percentual bem acima da média nacional, e estados do Sul, como Santa Catarina, com índices bem melhores.
O fato de o Brasil ter saído do Mapa da Fome deve ser louvado, mas não significa que a fome deixou de ser um problema. Quando a análise passa a ser mais local, e não nacional, vemos que muitos municípios ou estados permanecem com mais de 5% da população em insegurança alimentar grave, o limite utilizado para o país constar ou não no Mapa da Fome. Em uma análise regional, se fossem considerados países, as regiões Norte e Nordeste ainda estariam no Mapa da Fome da última vez que a insegurança alimentar foi mensurada no Brasil.
De modo geral, houve melhora significativa dos índices de segurança alimentar entre 2000 e 2013, mas até onde eu sei não temos um diagnóstico abrangente sobre segurança alimentar no Brasil há seis anos, o que é preocupante se considerarmos que somos um dos maiores players do setor agropecuário mundial. Quer dizer, produzimos alimentos para o mundo, exportamos mais de 100 bilhões de dólares em 2018, mas parece faltar um olhar mais cuidadoso para as injustiças sociais dentro do próprio país. Parece-me que a nova gestão do Ministério da Agricultura está mais atenta à necessidade de delinearmos soluções para o Semiárido e contribuirmos, dessa forma, com a redução da desigualdade que é uma das características mais salientes do setor agropecuário brasileiro.
A insegurança alimentar não deriva da falta de capacidade de produzir alimentos, isso o Brasiltem de sobra, mas resulta da distribuição ineficiente. Para delinearmos políticas públicas mais eficazes, precisamos investir mais em censos e pesquisas abrangentes sobre temáticas relevantes, tais como segurança alimentar.Em que consiste a Estratégia Intersetorial para a Redução de Perdas e Desperdício de Alimentos no Brasil? Qual é a função do Comitê Técnico de Perdas e Desperdício de Alimentos – CT PDA e da Câmara Interministerial de Segurança Alimentar e Nutricional – Caisan nesse processo?
Gustavo Porpino – A Estratégia é resultado do trabalho conjunto de instituições públicas e setor privado. Contamos, por exemplo, com a participação da Embrapa, Associação Brasileira de Supermercados, Ceagesp, Conab, WWF Brasil e vários técnicos de ministérios. O Comitê Técnico, liderado pelo antigo Ministério do Desenvolvimento Social – MDS, delineou uma estratégia que leva em conta a complexidade do sistema agroalimentar brasileiro. Enquanto nos países europeus as iniciativas estão mais voltadas para as etapas de varejo e consumo, no Brasil precisamos implementar soluções envolvendo também cooperativas de produtores e centrais de abastecimento, e ainda avançar com os projetos de Lei e políticas públicas alinhados com o tema. A Caisan é um núcleo muito importante para um país com nossa diversidade, complexidade e desigualdades, e nosso temor é que perca importância com as recentes mudanças ocorridas no antigo MDS. A Estratégia em si precisa entrar em implementação e, para tanto, precisamos de vontade política. Sem vontade política, não conseguiremos avançar também no ambiente legislativo. A Política nacional de combate às perdas e ao desperdício de alimentos, por exemplo, agrega diversos PLs que estavam em tramitação há vários anos, mas é uma pauta que concorre com várias outras no Congresso e não creio que será aprovada no curto prazo.
Quais são as linhas de ação para atingir os objetivos da estratégia para a redução de perdas e desperdícios de alimentos no país?
Gustavo Porpino – Temos quatro eixos de ação na Estratégia: Pesquisa e Inovação; Comunicação, educação e capacitação; Promoção de políticas públicas; e Legislação. As ações envolvem distintos públicos de interesse, mas ressalto a importância de mudarmos o comportamento do consumidor. O consumidor tem capacidade de influenciar os outros elos da cadeia, e, quando há maior consciência sobre o desperdício de alimentos, todos saem ganhando. Delinear estratégias ganha-ganha é um dos desafios. Por exemplo, não adianta implementar uma ação ou aprovar um Projeto de Lei que soluciona um problema em determinado elo, mas gera outro para a etapa seguinte da cadeia produtiva. Há casos no exterior que facilitam o processo de doação de alimentos por parte dos supermercados, mas se não for acompanhado do fortalecimento das redes de bancos de alimentos e se os bancos não estiverem nas áreas com maior incidência de insegurança alimentar, o desperdício que ocorreria no varejo tradicional será apenas postergado para a etapa seguinte. Do mesmo modo, em outro exemplo hipotético, penalizar financeiramente os supermercados que desperdiçam alimentos não ajuda a solucionar o problema.
O Brasil dispõe de mais de 200 bancos de alimentos, e essa rede é importante tanto para oenfrentamento do desperdício quanto para o combate à fome. O atual Ministério da Cidadania, em parceria com o Sesc e o WWF Brasil, está realizando uma pesquisa para avaliar a situação dos bancos de alimentos. Esse esforço é relevante porque possibilitará identificar quais bancos de alimentos precisam ser incrementados, onde há maior demanda, e direcionar intervenções para o fortalecimento da rede nacional de bancos de alimento.
De modo geral, para enfrentarmos o desperdício de alimentos, é preciso levar em conta a complexidade das interações entre os elos da cadeia produtiva e implementar ações alinhadas com o enfrentamento da insegurança alimentar.
Quais são os maiores desafios para atingir os objetivos propostos pela estratégia intersetorial?
Gustavo Porpino – O caso do Brasil é complexo pela necessidade de ações em várias frentes, desde investimentos em agrologística a iniciativas para melhorar a gestão da cadeia agroalimentar. Temos, por exemplo, que incrementar a capacidade do país de escoar a safra, substituirmos as embalagens inadequadas para acondicionar frutas e hortaliças por novas tecnologias, fortalecer a transferência de tecnologias para pequenos e médios produtores rurais, aproximarmos o consumidor urbano da produção de alimentos, e ainda conseguirmos elevar a importância da pauta segurança alimentar no ambiente legislativo e entre os formuladores de políticas públicas.
Talvez o maior desafio seja conseguir posicionar o tema segurança alimentar na agenda político-institucional com a importância merecida. Também precisamos fortalecer a visão de longo prazo, com políticas de Estado que consigam perpassar as frequentes mudanças que ocorrem, por exemplo, nos ministérios.
O Brasil é muito complexo, as cadeias produtivas não estão bem organizadas, em algumas delas diferentes atores defendem seus interesses e falta atuação conjunta entre elos importantes, tais como varejistas e produtores rurais, mas ao mesmo tempo vivemos um momento propício para fortalecer as conexões entre instituições de C&T, como a Embrapa, e o setor produtivo, na busca por soluções para problemas complexos. Há vários exemplos positivos de como esta interação entre a pesquisa e empreendedores pode impactar positivamente na geração de inovações. A iniciativa Ideas for Milk, por exemplo, une startups, pesquisadores e o setor produtivo e por meio dessa aproximação tem gerado soluções inovadoras para a cadeia produtiva do leite.
Como fomentar inovações que contribuam com a redução das perdas e do desperdício de alimentos?
Gustavo Porpino – A metodologia deste exemplo positivo que citei, o Ideas for Milk, pode ser utilizada também para a construção coletiva de novos modelos de negócio e soluções tecnológicas para a redução das perdas e do desperdício de alimentos. Há um crescente movimento global de agritechs e startups sendo lançadas para contribuir com a produção sustentável de alimentos, entre outros desafios. O Brasil é um dos países mais empreendedores do mundo, temos um setor agro com DNA inovador e se conseguirmos fortalecer as interações entre academia, instituições de C&T e mercado certamente avançaremos na adoção de novas tecnologias. O Sebrae, por exemplo, é um importante parceiro da Embrapa e também tem expertise no desenvolvimento de desafios para startups. Recentemente, a Embrapa teve uma experiência muito positiva atuando juntamente com investidores e aceleradoras de startups na chamada Pontes para Inovação, uma iniciativa de fomento a empresas que adotam tecnologias desenvolvidas pela Embrapa e parceiros. São esses novos modelos de incentivo à inovação no setor agro, com união de esforços de diferentes elos da cadeia produtiva, que irão ajudar o Brasil a enfrentar grandes desafios como o desperdício de alimentos.
Quais são as metas do Acordo de Paris, da Agenda 2030 e do Plano da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos para a Segurança Alimentar, Nutrição e Erradicação da Fome 2025 acerca da redução dos desperdícios de alimentos?
Gustavo Porpino – A Agenda 2030 das Nações Unidas tem como um dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável assegurar padrões de produção e consumo sustentáveis, e a meta 12.3 estabelece reduzir pela metade o desperdício de alimentos per capita mundial, nos níveis de varejo e do consumidor, e reduzir as perdas de alimentos ao longo das cadeias de produção e abastecimento, incluindo as perdas pós-colheita. No âmbito da América Latina e do Caribe, a redução do desperdício também está presente nos planos de fortalecimento da segurança alimentar. A FAO, por exemplo, coordena ação importante entre os países da América Latina para a implementação de ações conjuntas e compartilhamento de boas práticas, e vemos um movimento recente de união de esforços para a implementação do Pacto de Milão sobre Política de Alimentação Urbana na América Latina. A Embrapa também está engajada nestas discussões entre os países latinos. Recentemente, participamos da Semana da Alimentação e Agricultura, realizada pela FAO em Buenos Aires, e podemos conhecer melhor o programa nacional para redução do desperdício de alimentos em execução na Argentina. Por lá, o Senado aprovou uma Lei para desburocratizar a doação de alimentos e o dia 29 de setembro foi estabelecido como dia nacional das perdas e do desperdício de alimentos. A campanha “Valoremos los alimentos”, uma iniciativa da Secretaria de Agroindústria da Argentina, também está sendo fortalecida. Essas ações podem ser criadas pelos governos e impulsionadas com a participação do setor produtivo.
Atingir a meta do ODS 12.3 é um desafio imenso, e se levarmos em conta as projeções de estudos do Boston Consulting Group, por exemplo, o mundo caminha para o aumento do desperdício em vez da redução. E por que isso pode ocorrer? Temos tendências consolidadas de aumento da classe média global, novos padrões de consumo de alimentos derivados de um mercado mais exigente, e essas mudanças comportamentais e econômicas são acompanhadas de transformações do clima, e ainda crises humanitárias em regiões de conflito.
Considerando o atual índice de desperdício de alimentos no Brasil, quais são as possibilidades de o país alcançar os objetivos da Agenda 2030 e o Plano da Comunidade de Estados Latino-Americanos e Caribenhos para a Segurança Alimentar, Nutrição e Erradicação da Fome 2025?
Gustavo Porpino – É difícil fazer essa projeção porque depende de fatores múltiplos. Volto ao ponto da vontade política. Por vezes, ficamos com a impressão de que o Brasil caminha em círculos. É feito um enorme esforço de construção de política pública, mas a morosidade do Legislativo somada ao desinteresse de alguns altos gestores, tanto do poder público quanto da iniciativa privada, prejudica a capacidade do país de avançar.
A Embrapa tem buscado fazer a sua parte. Temos representantes na Caisan, participamos das discussões no Congresso, atuamos em parceria com o WWF Brasil, FAO e outras instituições, e várias Unidades de pesquisa já desenvolveram soluções tecnológicas que contribuem com a redução das perdas e do desperdício de alimentos. O Ministério do Meio Ambiente realizou, em 2018, um levantamento de boas práticas para o combate às perdas e ao desperdício de alimentos. A Embrapa foi uma das instituições reconhecidas e também atuamos em conjunto com o MMA no lançamento da Semana Nacional de Conscientização sobre o Desperdício de Alimentos, iniciativa que foi lançada no ano passado com a intenção de ser anual.