Em negociação sigilosa, a Advocacia-Geral da União (AGU), autora de pareceres contrários ao pagamento de auxílio-moradia a juízes e membros do Ministério Público no Supremo Tribunal Federal (STF), mudou de opinião e propôs às categorias a manutenção dos benefícios com “caráter indenizatório”, conforme informações do jornal O Globo.
No acordo, ao qual o jornal teve acesso, o repasse ficaria permitido mesmo na ausência de uma lei que o autorize, permanecendo amparado apenas em resoluções internas dos próprios órgãos. De acordo com as jornalistas Martha Beck e Renata Mariz, a proposta “foi apresentada em caráter reservado pela Secretaria-Geral de Contencioso da AGU na última reunião da Câmara de Conciliação e Arbitragem da Administração Federal, onde os interessados tentam chegar a um acordo sobre o pagamento do auxílio-moradia”.
No dia 21 de março deste ano, o ministro Luiz Fux, relator das ações sobre o tema no STF, suspendeu o julgamento das ações sobre o auxílio-moradia que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF) envolvendo a magistratura nacional e o Conselho Nacional de Justiça e remeteu os processos à Câmara de Conciliação da AGU. Na ocasião, o ministro atendeu a pedido da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB).
O acordo ainda será levado para homologação do Supremo Tribunal Federal (STF). No entanto, ainda haverá um próximo encontro no dia 16 de maio. Na última reunião, na proposta apresentada, a AGU argumentou que seria possível defender que leis orgânicas das carreiras já preveem o auxílio-moradia.
A reportagem diz que o órgão reforça a tese sob o argumento de que deve “ser construído o entendimento de que as resoluções que hoje embasam o recebimento do adicional pelo Judiciário e Ministério Público são atos normativos abstratos e gerais, portanto válidos. Dessa forma, estaria superada a necessidade de edição de lei formal”.
“A proposta não agradou aos participantes da reunião. Depois de discussões, a AGU deu a ideia de levar para homologação do Supremo critérios para o pagamento do auxílio-moradia, até que legislações formais sejam elaboradas pelo Congresso e no Legislativo dos estados. O argumento foi de que, com isso, uma decisão do plenário da mais alta Corte do país passaria a avalizar o benefício, e não mais resoluções. Levantou-se ainda a possibilidade de sugerir que o STF estabeleça um prazo para os pagamentos ocorrerem até edição de lei específica”, diz texto do jornal.
A proposta favorável da AGU, no entanto, destoa do mandado de segurança contra decisões monocráticas do ministro Luiz Fux, que autorizou o pagamento de auxílio-moradia a todos os magistrados do país no valor de R$ 4.377,73.
Em pareceres protocolados no STF desde 2014, a AGU alega que a concessão do auxílio é ilegal e está gerando dano irreparável à União porque “o montante de despesa mensal, não prevista no orçamento, atinge cifras milionárias e é de difícil ressarcimento, contrariando texto constitucional”.
Custos aos cofres públicos
O contribuinte brasileiro vai bancar este ano mais de R$ 2 bilhões com o pagamento do auxílio-moradia a autoridades e funcionários de alto escalão, cuja remuneração pode passar dos R$ 30 mil. Para ter uma ideia, com o valor do benefício seria possível construir mais de 43 mil casas populares, ao custo de R$ 50 mil cada, ou conceder Bolsa Família para 11 milhões de pessoas.
Essas são as despesas previstas com o benefício para os três poderes, o Ministério Público e a Defensoria Pública, no âmbito federal, e para conselheiros dos tribunais de contas de estados e municípios, juízes, procuradores, promotores e defensores públicos estaduais. O total gasto em todo o país com o auxílio-moradia é ainda maior. Não estão computadas na conta as despesas dos estados com representantes do Legislativo e do Executivo locais.
Os dados são de levantamento da Consultoria Legislativa do Senado. O orçamento federal para este ano reserva R$ 832 milhões para bancar o conforto de autoridades e servidores sem que precisem mexer no bolso, ou engordar seus contracheques. Em média, a verba varia de R$ 4 mil a R$ 4,5 mil por mês. O estudo não inclui os gastos dos governos estaduais.