Humberto Oliveira, Celia Watanabe, Severine Macedo, Elisa Guaraná e Jefferson Oliveira.
A política de desenvolvimento territorial no Brasil foi implantada nos governos petistas como um modelo de gestão de políticas públicas descentralizado, participativo e voltado para a inclusão de pessoas e lugares pobres no projeto de desenvolvimento do país.
A abordagem territorial do desenvolvimento obteve ampla adesão dos atores sociais do campo e das pequenas cidades rurais brasileiras, onde se concentra grande parte da população pobre e onde é mais difícil o acesso a serviços e equipamentos públicos que garantam direitos, qualidade de vida e oportunidades de desenvolvimento sustentável. Mulheres, indígenas, povos e comunidades tradicionais, quilombolas, jovens estão fortemente integrados na política de desenvolvimento territorial nos 243 territórios rurais já reconhecidos pelo Programa Nacional de Territórios Rurais.
A responsabilidade da implantação e execução da política de desenvolvimento territorial no Brasil coube ao Ministério do Desenvolvimento Agrário, MDA. Com a criação do Programa Territórios da Cidadania, um conjunto de Ministérios passou a adotar a abordagem territorial para chegar aos menores e mais longínquos municípios do Brasil, com políticas públicas apresentadas de forma integrada e em diálogo com os governantes municipais e representantes da sociedade civil local, ampliando orçamento e priorizando ações ajustadas às demandas sociais de cada território, reduzindo as desigualdades entre as áreas rurais e urbanas do país.
O golpe de estado sofrido pelo Governo da Presidenta Dilma veio interromper de forma violenta a trajetória da política de desenvolvimento territorial, seja pela decisão do governo interino de extinguir o MDA, seja, sobretudo, por afetar profundamente a estratégia de desenvolvimento territorial ao atentar contra o estado democrático de direito que é um pressuposto básico do desenvolvimento sustentável com participação social.
Neste momento em que o MDA preparava uma ação conjunta nos territórios rurais do Brasil com a Secretaria de Governo da Presidência da República, para uma articulação com os demais ministérios visando à realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) – compromisso internacional do país assumido perante as Nações Unidas –, a interrupção golpista jogou por terra uma oportunidade para os mais de 70 milhões de habitantes dos cerca de 5.000 municípios rurais do Brasil, tendo em vista que os ODS, “embora de natureza global e universalmente aplicáveis, dialogam com as políticas e ações nos âmbitos regional e local”; e, um dos 17 objetivos trata justamente de reduzir as desigualdades dentro dos países.
O governo interino que se instalou de forma ilegítima e iniciou um processo de desmanche de políticas e programas sociais, com redução de direitos e garantias mínimas de qualidade de vida para a população mais pobre, coloca o Brasil frontalmente contra os ODS. Além de ver maculada ainda mais a sua imagem, já duramente afetada com o golpe contra a nossa jovem democracia, o Brasil corre o risco de ser um dos países que fiquem para trás nesse processo civilizatório, pois a realização da Agenda dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável até o ano 2030 é apenas um patamar mínimo que devem alcançar as nações no ambiente de desenvolvimento humano em nosso planeta.
Neste cenário, os territórios rurais serão certamente os mais atingidos, pois é ali onde estão concentrados os principais déficits sociais e onde é mais necessário que se alcancem os ODS. Por essa razão, denunciamos as graves consequências que sofre neste momento da história do nosso país, a política de desenvolvimento territorial.
Pelo que significa hoje para o Brasil, e por ser atualmente a maior referência de política de desenvolvimento territorial na América Latina, e ainda pelo que representa como possibilidades de avanços para o desenvolvimento sustentável, é urgente interromper e fazer retroagir o golpe e restabelecer a ordem democrática, para retomar o rumo da política de desenvolvimento territorial brasileira no curso da realização dos ODS.