Milhares de pessoas em todos os estados e no DF foram às ruas defender o impeachment da presidenta Dilma Rousseff e protestar contra o governo, a atual situação do país, e também contra a oposição neste domingo (13). A maioria dos participantes era formada por homens (57%), com idade superior a 36 anos (73%), curso superior completo (77%) e com renda superior a cinco salários mínimos (63%), segundo pesquisa do instituto Datafolha. O perfil é semelhante ao de outras quatro manifestações pelo impeachment em São Paulo, em anos anterior.
Convocada por novos grupos de direita, como Revoltados Online, Vem Pra Rua e Movimento Brasil Livre, o ato foi “oficialmente” apartidário, e os organizadores orientaram os manifestantes a não portarem símbolos ou bandeiras de partidos políticos. No entanto, a presença de representantes de legendas de direita, como PSDB, Solidariedade e o ainda não registrado Partido Novo, ocorreu durante todo o ato.
O nome mais consensual entre os manifestantes era o do juiz federal Sergio Moro, exaltado em praticamente todas as capitais, sem nenhuma crítica. Angelica, uma das manifestantes ouvidas pela reportagem, foi questionada sobre a razão de alguns investigados por ele não serem processados, como o senador Aécio Neves (PSDB-MG): “Não sei, porque eu nunca vi o processo”.
Outro consenso entre os manifestantes parece ser a ausência de perspectivas a longo prazo. Diversas pessoas ouvidas pela reportagem não souberam definir quem teria condições de assumir o governo do país. Rute, uma das ouvidas, foi sincera: “Não sei. Não tem”.
Após os atos, a presidente Dilma Rousseff repetiu em nota que “a liberdade de manifestação é própria das democracias e por todos deve ser respeitada” e destacou o caráter pacífico das manifestações. “Isso demonstra a maturidade de um país que sabe conviver com opiniões divergentes e sabe garantir o respeito às suas leis e às instituições”, afirmou.
Ato na paulista pede intervenção militar | Foto: Rafael Tatemoto/BdF |
São Paulo: Tucanos são rechaçados
Em São Paulo, a avenida Paulista, no centro, foi ocupada em toda sua extensão. Segundo a Secretaria de Segurança Pública, o número de participantes foi de cerca de 1 milhão e 400 mil pessoas; alguns organizadores falaram em 3 milhões, e o Instituto DataFolha estimou a presença de 450 mil manifestantes.
O primeiro carro de som que podia ser avistado por quem entrava na Paulista a partir da Consolação pertencia à Ação Popular, organização dirigida por integrantes da juventude do PSDB próximos ao grupo do senador José Serra (SP) dentro do partido.
Entretanto, a comitiva liderada pelos tucanos Geraldo Alckmin (SP) e Aécio Neves não foi bem recebida e permaneceu apenas 30 minutos no protesto. Parte dos manifestantes gritava “oportunistas”, e outros os xingavam fazendo referência aos “roubos na merenda” e às “citações na Lava-Jato”. A cena se repetiu com Marta Suplicy (PMDB) e Andrea Matarazzo, pré-candidato do PSDB à prefeitura de São Paulo. Ao tentar discursar no carro da Ação Popular, o candidato também foi vaiado.
Também estavam presentes militantes do Partido Novo, de orientação ultraliberal, que busca sua legalização e registro na Justiça Eleitoral. Mas a sigla que mais marcou presença na manifestação foi o Solidariedade, fundado por Paulinho da Força: boa parte dos manifestantes ostentava um adesivo laranja confeccionado pela legenda e que levava o nome do partido.
Entidades empresariais e profissionais, como Fiesp, Associação Comercial de São Paulo e Associação Médica Brasileira, apoiaram a organização e também marcaram presença. Organizações mais identificadas com a ideologia de direita também estavam presentes, como a Tradição Família e Propriedade, grupo católico ultraconservador, e o Instituto Ludwig von Mises Brasil, que distribuía balões com a inscrição “Menos Marx, Mais Mises”, em referência ao economista austríaco ultraliberal.
Rio de Janeiro: iniciou na parte da manhã
No Rio de Janeiro, os manifestantes começaram a concentração por volta das 10h, na avenida Atlântica, em Copacabana. A dispersão aconteceu logo às 14h, antes de chegar ao Leme, não cumprindo assim o que haviam previsto os organizadores do protesto. Não houve consenso quanto ao número de participantes, mas os organizadores estimam em 1,5 milhão.
O ponto alto foi a presença do jovem chamado Rodrigo Brasil, conhecido nas redes sociais por sua posição anti-PT e a favor do deputado Jair Bolsonaro (PP). Ele chegou em um carro esportivo da marca Peugeot, movido a controle remoto. “Com isso queremos dizer que o país está sem direção”, disse o manifestante indignado. Rodrigo também aproveitou a atenção recebida para fazer críticas à crise.
Apesar de pacífico, houve momentos de tensão entre os manifestantes e organizadores. O locutor do carro de som pediu que os presentes xingassem a presidente Dilma Rousseff. “Vamos gritar todos ‘fora vaca’”, disse o líder do protesto. Muitos aderiram ao chamado, mas uma parte não concordou. “Assim vamos baixar o nível”, protestou uma senhora de uns 60 anos.
Alguns manifestantes também reivindicavam a intervenção militar no país. “Essa é a única maneira de o Brasil se livrar de tanta corrupção, tanta sujeira. A única maneira é os militares tomarem conta”, disse um dos manifestantes, que se identificou apenas como Josias.
Porém, nem todo mundo concordou com o que ouviu em Copacabana. O aposentado Claudio Peçanha, de 70 anos, foi vender picolé e tentar ganhar um dinheirinho extra. “Estou aqui trabalhando, não concordo com isso. Acho que tirar a Dilma não soluciona nada”, disse o ambulante.
Extremismo
Do lado oposto ao carro da Ação Popular, encontravam-se ao menos dois trios elétricos que defendiam abertamente a volta da ditadura militar no país, chamada pelos manifestantes pela forma eufemística de “intervenção constitucional”. Diversos manifestantes carregavam balões nos quais se podia ler “SOS Forças Armadas”.
“Eu prefiro a intervenção [militar] porque acaba com essa roubalheira”, afirmou Adilson, um dos presentes. Questionado se o regime militar não foi um dos governos mais corruptos da história do país, responde: “Foi, mas trouxe muito benefício para o país”. Adilson também afirmou acreditar que uma volta dos militares ao poder seria provisória e “duraria pouco tempo”.
Além disso, diversos carros de som pediam saudações à Polícia Militar, cujo helicóptero chegou dar um voo rasante para animar os manifestantes, que também aplaudiam a passagem de carros da corporação.
Habibs engajado: sucesso em SP, fracasso no RJ
A “pariticipação” mais inusitada, entretanto, foi dos restaurantes Habibs e Ragazzo, pertencentes ao mesmo grupo empresarial. Ambas as cadeias distribuíam cartazes aos manifestantes. Na avenida Paulista, um deles dizia: “Olha que legal, o Brasil parou e não é Carnaval”. O som vindo do carro do Vem Pra Rua, porém, contradizia a mensagem. Lá podia-se ouvir músicas como “Do Seu Lado”, do Jota Quest, “Ciúme”, do Ultraje a Rigor e “Born to be Wild”, da banda norte-americana Steppenwolf. Por volta das 17h, os locais estavam lotados ainda.
Já no Rio, o Habib’s espalhou cerca de 10 mil cartazes com frases como “Quem espera sempre alcança” e “Eu não vou desistir do Brasil” na avenida Atlântica, sem sucesso. No final do protesto, o quiosque do Habib’s continuava vazio, enquanto os manifestantes preferiram os restaurantes chiques da avenida, onde um prato de comida custa em média 60 reais por pessoa.