Processo do MPE é um “atentado contra a democracia”, diz apoiador do PSOL

 

Lucas Mourão (foto), 26, advogado e sócio do escritório Flora, Matheus e Mendonça Advogados Associados, é um dos casos mais destacados. Ele foi informado sobre seu processo em agosto, pouco depois do início de seu andamento.

Lucas está sendo perseguido pelo MPE por doar R$ 60,00 para as campanhas de Jean Wyllys (candidato a deputado federal) e Tarcísio Motta (a governador), ambos do PSOL do Rio de Janeiro, onde mora.

Segundo ele, além do constrangimento de passar por uma situação como essa, a preocupação principal em relação a este caso é o “prejuízo político e o dano à democracia que esse tipo de investida institucional irresponsável contra doadores dessas minúsculas quantias pode trazer”.

Qual o argumento do Ministério Público Eleitoral para abrir um processo contra você?

A lei determina que a doação de pessoa física para candidaturas ou partidos não pode ser superior a 10% do rendimento bruto total do ano anterior à doação. E é exatamente isso que alega o MP no meu e em todos os outros casos similares, que a doação foi superior a esse limite.

Ou seja, para que o MP tenha concluído que os meus perigosos 60 reais doados tenham superado esse limite, ele – o MP – precisa supor que em 2013 eu tive uma renda menor que 50 reais por mês… Na verdade eu era isento e ainda que não tivesse renda nenhuma teria o direito de fazer doação até o limite de 10% do teto da isenção, o que corresponderia a um valor cerca de 40 vezes mais alto do que a minguada doação que pude fazer à época. Esse é o entendimento uníssono dos tribunais eleitorais.

Quando você foi informado do processo?

Em agosto, pouco depois do início do processo. Quando eu fui informado, contudo, meu sigilo fiscal já havia sido quebrado e o MP já sabia da minha condição de isento e, portanto, já sabia do caráter infundado do processo.

Quais serão seus desdobramentos?

Minha preocupação não é pessoal, estou convicto de que não há nenhum fundamento jurídico mínimo para sustentar o pedido do Ministério Público e certamente a Justiça Eleitoral decidirá pela total improcedência da ação. Na absurda hipótese de eu ser condenado, a “pena” seria uma multa que pode variar de 5 a 10 vezes o valor da doação.

Mas, repare, o próprio processo já é um dano e uma punição considerável. Imagine quanto trabalho, preocupação e dispêndio está tendo agora um jovem da periferia, leigo em direito, que doou 20 reais para o seu candidato e meses depois recebeu uma carta dizendo que está sendo investigado pela justiça eleitoral. Possivelmente teve que contratar advogado com o dinheiro que não tinha e está preocupado com um processo absolutamente ilegítimo e com fundamentos cabalmente contrários ao direito.

O que me preocupa, de fato, é o prejuízo político e o dano à democracia que esse tipo de investida institucional irresponsável contra doadores dessas minúsculas quantias pode trazer. Essa pessoa comum, que tenha se encantado com uma campanha e resolveu contribuir com 20 reais, certamente não vai ousar voltar a contribuir depois de ter que se defender de um processo na Justiça por conta dessa doação. Quero dizer, não é só um constrangimento, mas também (e principalmente) um atentado contra a democracia.

mourao2Você é militante do PSOL?

Sim. Há mais ou menos 5 ou 6 anos.

Conhece mais gente que está passando pela mesma situação?

Sim, conheço várias pessoas que está passando por isso.

Lucas Mourão. Foto: Facebook

Acredita que o processo aberto contra você e outros apoiadores de partidos de esquerda possa ter motivações políticas?

Não faço a menor ideia. O fato é que o MPE sabe que o que está pedindo não tem nenhuma base legal, mas insiste mesmo assim, o que é bastante estranho. E todas as pessoas que estão passando pelo mesmo problema (com as quais eu tive contato) têm um padrão comum: doaram valores minúsculos, eram isentos do IR no ano anterior à doação (relativamente pobres, portanto), e destinaram suas doações a partidos de esquerda, notadamente o PSOL.

Claro que isso é um padrão que percebi apenas com as pessoas que eu conversei e talvez não seja representativo. Mesmo assim, é bem, digamos, esquisito.

Aliás, bom dizer, só de gasto com energia elétrica, tempo, papel, tinta e correios foram gastos muito mais do que os super-suspeitos 60 reais que eu doei.

Qual a sua opinião sobre a aprovação do fim do financiamento empresarial de campanha?

É um avanço democrático. Um amadurecimento importante do nosso sistema, especialmente em tempos nebulosos onde o óbvio fica cada vez mais claro: que empresas só financiam partidos e candidaturas com o objetivo de transformar a doação em parte de sua cadeia de investimentos.

Sempre há a possibilidade do caixa 2, que fora o tempo todo a ameaça dos grandes partidos para que o financiamento empresarial se mantivesse. Bom, é possível que haja, mas aí esse tipo de doação inescrupulosa já terá sido jogado no limbo da ilegalidade.

Você acha que é democrático estabelecer um limite de 10% da renda de uma pessoa física para doação? Porque 10% da renda de um rico é mais do que 10% da renda de uma pessoa pobre…

Eu ainda estou amadurecendo sobre essa questão. De maneira imediata me ocorre que um valor fixo por CPF seria o mais adequado e democrático exatamente pelo que você disse, certamente os 10% do Marcelo Odebrecht são bem mais significativos que os 10% de um assalariado da construção civil e isso, em tese, desequilibraria a disputa.

Deixe um comentário

dezenove − 5 =