Artigo de Alessandra Cardoso, assessora política do Inesc, originalmente publicado no blog O Brasil e a Agenda 2030, da Associação Brasileira de Organizações Não-Governamentais (Abong).
O Plano Plurianual do governo federal dialoga com os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável?
O governo brasileiro diz ter participado ativamente da construção dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), o qual resultou na definição de 17 Objetivos e 169 metas, envolvendo temáticas diversificadas, como erradicação da pobreza, segurança alimentar e agricultura, saúde, educação, igualdade de gênero, redução das desigualdades, energia, água e saneamento, padrões sustentáveis de produção e de consumo, mudança do clima, cidades sustentáveis, proteção e uso sustentável dos oceanos e dos ecossistemas terrestres, crescimento econômico inclusivo, infraestrutura e industrialização, governança, e meios de implementação.
Mas em que medida esta participação influenciou a visão de médio prazo do governo por meio da sua proposta de Plano Plurianual (PPA 2016-2019) que acaba de ser enviada ao Congresso Nacional (PL nº 06/2015-CN)?
Se olharmos os objetivos e os indicadores dos ODSs, veremos que trazem compromissos e desafios que não encontram o devido respaldo na principal, e pouco efetiva, peça de planejamento de médio prazo do governo brasileiro que é o PPA que está agora em tramitação no Congresso Nacional (PL nº 06/2015-CN).
Em uma primeira leitura do PPA com a lente dos ODSs, pontuamos que tanto as propostas saídas dos ministérios setoriais do governo, quanto aquela formatada como posição de governo no âmbito do Ministério do Planejamento e da Secretaria Geral da Presidência, apenas indiretamente e muito tangencialmente dialogam com os objetivos e indicadores estabelecidos nos ODSs.
Ao que nos parece, estes dois processos seguiram cursos paralelos. Uma boa mostra disto é a ausência explícita do esforço de construção e implementação dos ODSs na estrutura no PPA. A visão estratégica do PPA que é parte da mensagem presidencial do Projeto de Lei enviado ao Congresso não faz referência alguma a este importante esforço internacional de construção dos ODSs que, para ser efetivado, dependerá da capacidade de planejamento e implementação de políticas de médio e longo prazo.
Além disto, infelizmente, sequer houve um esforço governamental significativo de promoção de diálogos e concertação de visões e interesses inter e intra setorial no governo o que seria essencial para que os ODS estivessem mais bem refletidos no PPA.
Por exemplo, o Ministério de Minas e Energia não dialogou com o Ministério do Meio Ambiente ou/e com a Funai para pensar como o planejamento da oferta de energia e a diversificação da matriz energética poderiam caminhar na direção de garantir um desenvolvimento de fato sustentável, o que não acontece hoje com a sobreposição de conflitos e violações derivadas do avanço de projetos hidrelétricas na Amazônia.
É claro que alguns dos objetivos e metas dos ODSs apresentam uma formulação próxima àquelas já utilizadas nas nossas políticas públicas e no PPA (por exemplo: acabar com a pobreza, com a fome, assegurar a educação inclusiva e equitativa de qualidade). Mas esta correspondência parece ser fruto do trabalho do governo brasileiro de colocar lá nos ODS alguns dos esforços já em curso independente deste compromisso internacional.
Assim, a despeito de evidenciar alguns temas e desafios similares, o PPA não parece ter tido sua estrutura de prioridades, metas e indicadores influenciada pelo conjunto dos objetivos e indicadores dos ODSs. Além disto, a busca desta correspondência não nos parece ser uma tarefa fácil daqui para frente.
Vale lembrar que cogitou-se no espaço participativo da construção do PPA a construção de uma agenda temática do PPA que espelhasse os compromissos assumidos no âmbito do ODS. Mas é importante registrar que tanto esta possível agenda temática (com todos seus limites) quanto as demais agendas temáticas cogitadas padecerão de consistência se não houver um compromisso mais efetivo de diálogo e coordenação intersetorial dentro do governo, se o sistema de monitoramento e prestação de contas destas agendas e compromissos (que ainda não saiu do papel) sair do marco do discurso e ganhar concretude e, acima de tudo, se todo este esforço não for comprometido diante do atual quadro de crise econômica e política.
O único compromisso expresso pelo governo brasileiro foi lançado pela Ministra do Meio Ambiente, Izabela Teixeira, em Nova Iorque, durante a Cúpula dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da ONU, no dia 25 de setembro. Está planejada uma Conferência Nacional sobre os ODS no segundo semestre de 2016, do corrente ano.