Mariana Trotta, professora da UFRJ, apontou na primeira mesa do Seminário sobre a democratização do sistema de justiça, para a sub-representação dos negros e negras na composição do Poder Judiciário e para a necessidade de se repensar o conteúdo curricular das universidades de direito. Confira:
Você nos mostrou dados que apontam para uma composição do Judiciário que não dialoga com a representação da população brasileira, principalmente na questão racial e de gênero. Em uma sociedade de classes onde vivemos e que os negros compõe a maioria da população em estado de vulnerabilidade social, essa composição do Judiciário determina uma característica elitista?
Mariana: A gente tem um processo apontando por alguns pesquisadores do sistema de justiça que mostram essa sub-representação dos negros nas instâncias do Poder Judiciário. Por isso é tão importante debatermos cotas de acesso aos cargos do sistema da magistratura, na defensoria pública, no Ministério Público, aliado ao sistema de cotas nas universidades públicas.
Percebemos que essa falta de representação dos negros e negras nas instâncias do Poder Judiciário contribui com atuação desse Poder em algumas demandas, visto que nós pensamos a partir dos locais onde nós pisamos. Se as temáticas são tão distantes e quando não se tem qualquer diálogo nas universidades com conteúdos que envolvam racismo, opressões históricas de gênero, e da luta por direitos, faz com que haja dificuldade de percepção, por parte dos magistrados, sobre essas temáticas.
A primeira do Seminário foi composta por três professores da Universidade, e se comprovou que há uma deficiência no grau de formação nas pessoas que mais tarde se tornaram operadores do direito. É condicionante para uma mudança do sistema de justiça uma mudança curricular nas Universidades?
Mariana: Certamente. Acho que a gente teve alguns avanços nas mudanças curriculares nos últimos anos, mas ainda é preciso se avançar muito mais, principalmente na pauta dos direitos humanos, nas suas mais diferentes esferas. Muitas vezes os estudantes de direito saem das universidades sem ter acesso a esses conteúdos.
Como disse o representante do Ministério da Justiça, aqui no seminário, são mais de três milhões de bacharéis em direito formados por ano, na década de 90 teve um “boom” de faculdades privadas que não se preocupavam com a grade curricular e sim com a quantidade de alunos/clientes que ingressavam. Esse é um grande problema a enfrentar se queremos qualificar o acesso da população ao sistema de justiça.
Como é possível superar essa realidade no sistema de justiça?
Mariana: Temos que começar desde a formação, seja nas universidades, como nas escolas de magistratura, passando por uma democratização do acesso para a composição do Poder Judiciário, como mecanismos como o sistema de cotas e mecanismos de controle e de participação social nas instâncias do Judiciário brasileiro.