Por Paulo Itacarambi*
A aprovação na Comissão Especial da Câmara, por unanimidade, do Projeto de Lei nº 6826, conhecido como Lei Anticorrupção, é um grande passo para o desenvolvimento da responsabilidade social nas empresas. A punição deixa de atingir apenas o funcionário que tenha cometido algum ato de corrupção contra a administração pública nacional ou estrangeira e alcança a própria empresa. Melhor: as empresas que implantam sistemas de prevenção da corrupção e de compliance com a legislação passam a ter atenuantes legais no caso de serem arroladas em malfeitos que não tenham conseguido evitar.
Por que essa lei é tão importante?
Além de drenar os recursos da sociedade que deveriam ir para saúde, educação, segurança e infraestrutura, a corrupção também é um grande obstáculo ao desenvolvimento econômico e sustentável do país. Por isso, a Lei Anticorrupção é fundamental.
As empresas sérias, que trabalham dentro da lei e buscam a competição leal e transparente por melhores posições no mercado, têm na corrupção uma inimiga dos negócios. A corrupção mina essa competição leal e, pior: quando não é punida, dissemina por toda a sociedade a ideia de que o melhor é não ter ética.
A corrupção torna empresas ineficientes em empresas mais competitivas do que aquelas que investem em inovação e em boa governança. Portanto, a corrupção acaba desestimulando o próprio investimento.
A corrupção muda as referências. Quem tem ética passa a ser considerado um perdedor um bobo, um ingênuo, um idealista. Ganha quem sabe “tirar vantagem de tudo”. Onde não há ética não há direitos garantidos, nem trabalhistas, nem civis. Por isso, combater a corrupção deve ser uma iniciativa de toda a sociedade.
Assim, desde 2004 o Instituto Ethos pede uma legislação como essa e participou ativamente da mobilização de empresas em favor da aprovação do PL nº 6826. Já nas primeiras reuniões do Conselho de Transparência da Presidência da República, neste ano, o Instituto Ethos apresentou proposta de criação de um cadastro de empresas envolvidas em corrupção, para que elas não tivessem acesso a recursos públicos, como já ocorria com aquelas condenadas por trabalho análogo à escravidão.
Em 2006, como forma de reagir às denúncias de empresas que participavam do que se convencionou chamar de “mensalão”, o Ethos e várias organizações criaram o Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção, um compromisso voluntário que as empresas e organizações signatárias assumem para aprofundar a ética e a transparência nas relações entre si, com o mercado e com o setor público.
Em 2007, as mesmas entidades criaram o Grupo de Trabalho Empresas pela Integridade, para apoiar as signatárias em suas ações anticorrupção e propor políticas públicas de promoção da integridade e da transparência.
Em 2008, as empresas participantes da Conferência Ethos daquele ano, propuseram a criação de um marco legal de responsabilização criminal e civil da pessoa jurídica, que foi levado pelo representante do Ethos ao Conselho Nacional da Transparência Pública.
A Controladoria-Geral da União (CGU) e o Ministério da Justiça, com contribuição da Advocacia-Geral da União (AGU) e da Casa Civil da Presidência da República, encaminharam o PL ao Legislativo no início de 2010.
Queremos aproveitar aqui a oportunidade para cumprimentar a CGU por iniciativas como essas, da Lei Anticorrupção, e da Lei de Acesso à Informação, que vão tornando o país mais democrático e justo.
É bem verdade que o PL nº 6826 teve o trâmite demorado e foi modificado por pressão de parte do setor empresarial. Mas é importante ressaltar que outra parte – significativa – desse mesmo empresariado propôs e vem apoiando essa lei desde o início, porque ela é benéfica ao próprio desenvolvimento dos negócios.
Cenário internacional
Não é por acaso que os países listados como menos corruptos também são aqueles que ocupam as melhores posições nos indicadores de competitividade global e nos índices de qualidade de vida.
Por isso, a Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) considerou a corrupção um problema global e estabeleceu um pacto ao qual todos os países dessa organização tiveram de aderir (inclusive o Brasil). O pacto proíbe o suborno e propõe a responsabilização jurídica das multinacionais envolvidas em casos de corrupção no país onde praticaram o ato e em seu país-sede.
A Lei Anticorrupção torna obrigatórios alguns dos compromissos que as empresas signatárias já assumiram voluntariamente no Pacto Empresarial pela Integridade e contra a Corrupção.
A lei também pode abrir espaço para autorregulação, com as empresas tornando válido o que ficou de fora do projeto que vai ao Senado. Um desses itens é a proibição de que empresas condenadas por corrupção obtenham empréstimos em bancos públicos. Isso foi retirado, mas o projeto manteve o chamado “cadastro sujo”, de empresas condenadas por atos ilícitos contra a administração pública. Assim sendo, empresas e bancos públicos podem assumir o compromisso voluntário de não negociar com as organizações que estiverem listadas nesse cadastro, como já se faz com relação ao trabalho análogo à escravidão.
* Paulo Itacarambi é vice-presidente executivo do Instituto Ethos.